Quase ao lado temos a Torre dos Clérigos, mas nem por isso o edifício amarelo e cinzento do Centro Português de Fotografia (CPF) perde imponência. Para lá da dimensão granítica da construção, salta à vista de um primeiro olhar as grades que tapam algumas das janelas. Elas lembram bem que ali já funcionou uma cadeia. Lá dentro, enormes portas feitas de grades de ferro marcam a separação entre aquilo que em tempos seriam as secções da prisão. O edifício é enorme, e tudo ali foge à escala humana. Mas, aquilo que outrora funcionou como uma prisão é, agora, uma porta que se abre para os novos talentos da fotografia.

Aberto desde 2001, o Centro Português de Fotografia assume-se como uma importante referência no panorama da fotografia nacional. Trata-se de um serviço que foi criado em 1997 pelo Ministério da Cultura e que vem, desde então, assegurando um importante apoio nos campos do património fotográfico, divulgação e formação na área de fotografia, como explicou a directora do CPF, Teresa Siza, ao JPN.

O grande objectivo é abranger um público vasto, alargando a área de intervenção à mostra de trabalhos de vários autores, com temáticas muito diversas. Para além das exposições, o CPF tem apoiado o trabalho de fotógrafos, através de “programas de apoio financeiro a projectos que são apresentados e avaliados em concurso público”. De acordo com Teresa Siza, essa ajuda passa também pela atribuição de bolsas de estudo. No campo do património cultural, o CPF tem a responsabilidade de “dar continuidade à colecção nacional de fotografia, que neste momento tem cerca de duas mil peças”. Quanto à área da formação, Teresa Siza salienta a importância dos workshops organizados pelo CPF, que são geralmente “abertos a todo o público”. Mas também há oficinas mais “direccionadas para especialistas”. Os mais novos também não foram esquecidos: “temos uma oficina para crianças que se chama “Aprender fotógrafo”, refere a directora do centro.

“Não podemos funcionar em circuito fechado”


Questionada acerca de um maior ou menor equilíbrio entre a divulgação de autores portugueses e estrangeiros, Teresa Siza foi peremptória: “não há essa política”. De acordo com a directora do Centro de Fotografia, “tem havido um equilíbrio, praticamente a 50%, entre autores portugueses e estrangeiros, porque nem toda a gente pode ir com facilidade a Paris, a Londres ou a Nova Iorque ver exposições”. Teresa Siza defende que “mostrar fotografia internacional é contribuir para alimentar a cultura fotográfica das pessoas” porque, “num mundo globalizado, não podemos funcionar num circuito fechado de fotografia portuguesa”.

A história da “Relação”

Para lá da história e do passado da Fotografia, uma visita ao CPF pode ser também um recuo no tempo. Concluído em 1796, o edifício que hoje alberga o Centro Português de Fotografia é considerado um dos mais emblemáticos da cidade do Porto. Em tempos foi uma cadeia, e ainda hoje é conhecido como edifício da antiga Cadeia da Relação. Camilo Castelo Branco e Ana Plácido, protagonistas de um dos mais polémicos romances vividos durante o século XIX, estiveram lá presos por crime de adultério. O último preso saiu em 1975, altura em que a cadeia deixou de funcionar como tal. Hoje em dia, o edifício da Cadeia da Relação do Porto abriga o Centro Português de Fotografia desde 2001. Com dois séculos e meio de história, o edifício foi projectado pelo arquitecto-engenheiro Eugénio dos Santos e Carvalho durante a segunda metade do século XVIII. Já em finais do século XX, os arquitectos Eduardo Souto Moura e Humberto Vieira esboçaram a recuperação do edifício. O CPF reabriu em 2001, por altura da Capital Europeia da Cultura. “A partir daí, a afluência do público aumentou muitíssimo”, conta Teresa Siza. Os espaços de exposição cresceram e abriram renovados. Isto permitiu “operacionalizar valências que até então estavam muito reduzidas”. Teresa Siza dá o exemplo da biblioteca e dos laboratórios, onde agora é possível a “realização de workshops de natureza prática”. Mas, o aumento dos espaços de exposição, que antes de 2001 funcionavam apenas no rés-do-chão, foi um factor igualmente decisivo. Agora é possível mostrar fotografia em todos os pisos: “temos espaços de exposição nos três andares da Cadeia, o que é muito”, realça. E é precisamente nesses espaços que podem ser visitadas, até 9 de Maio, as três recém inauguradas exposições: “Buracos Negros e outras inconsistências”, “Água” e “150 anos de Fotografia Espanhola”.

Ana Correia Costa (texto e fotos)

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