Ao que parece, era quase tudo mentira. A infidelidade de David Beckham foi afinal um escândalo fabricado. Durante a última semana, os tablóides ingleses garantiam que o jogador do Real Madrid tinha tido um “affair” com a sua assistente pessoal, Rebecca Loos. Veio hoje a público que a divulgação da “pseudo-notícia” foi planeada por Max Clifford, relações públicas da assistente de Beckham.

Clifford e Loos negociaram com o jornal “News of the World” declarações bombásticas. Por 607 mil euros, Rebecca Loos contaria pormenores de uma suposta relação com o jogador, entre Setembro e Novembro de 2003. A “pseudo-notícia” é revelada e logo se torna manchete em todos os jornais.

A novela acabava aqui se Victoria, mulher de Beckham, não tivesse contratado um paparazzi, Jason Fraser, para tirar fotos suas de mão dada com o marido. O objectivo era mostrar que estava tudo bem na relação do casal. A história continua a alimentar os jornais, que venderam com o escândalo e depois com a revelação de que tudo foi planeado pela assistente e pelo “relações públicas”.

“Até o desodorizante de Beckham se vende…”

Para Vasco Ribeiro, assessor e docente de Gabinetes de Imagem, o escândalo de Beckham é uma estratégia de imagem. “É uma estratégia da assistente dele. Ela ganhou popularidade. Há umas semanas não existia. Agora torna-se na nova Monica Lewinsky, que daqui a uns anos lança o livro a contar a sua suposta relação com Beckham”, afirma.

“Tudo isto vai de encontro à imprensa cor-de-rosa. O Beckham é um produto de imagem, independentemente de ser bom jogador ou não. É tudo construído. É tudo vendido. Até o desodorizante se vende… De um lado temos a imagem real de um jogador sem escolaridade, que nem sabe soletrar palavras. De outro, temos a imagem construída, que todos conhcemos e que é a que vende”, considera Vasco Ribeiro.

A verdade nos media

Mas o caso Beckham tem também levantado a questão: até que ponto os media podem fabricar notícias? Para Suzana Cavaco, docente de Deontologia Jornalística, os meios de Comunicação Social podem criar a realidade. “Os media vivem de vender notícias. A tentação é enorme. Estes casos inventados como o de Beckham vendem a curto prazo, mas não a longo prazo”, refere.

Suzana Cavaco considera que há que ter em conta que a fonte destas “pseudo-notícias” foi um “relações públicas”. “Quem fabricou a realidade foi a fonte. A fonte manipulou os media. Mas estes são obrigados a averiguar a informação. O dedo, neste caso, deve ser apontado à fonte. Convinha aos media serem ingénuos, porque esta notícia vendia. Mas um assessor que inventa uma notícia acaba por fazê-lo só uma vez, pois perde a credibilidade”, afirma.

Para Vasco Ribeiro, o poder de um “relações públicas” é “quase total”. “A informação é feita com base nas fontes. A rotina produtiva das notícias depende quase totalmente das fontes. As primeiras páginas dos jornais têm como base os assessores de imprensa e relações públicas. Por exemplo, por vezes, uma inauguração surge por razões de agenda mediática”, refere.

E em Portugal? Existirão “escândalos como o de Beckham”?

“Ultimamente, por exemplo, tivemos o caso de Artur Albarran e da esposa. Mas também já tivemos o de Tomás Taveira”, refere Suzana Cavaco. Para a docente de Deontologia Jornalística, a reserva da intimidade da vida privada deve ser respeitada: “As pessoas abrem as portas à Comunicação Social. Mas isso não dá o direito de invadir a privacidade dessas pessoas, ainda que tenham aberto a porta uma vez”.

O surgimento destes escândalos parece acompanhar o crescimento de jornais sensacionalistas no nosso país. “O «24 Horas» é o jornal que mais cresceu nos últimos anos. Mas tal pode dever-se ao formato, à dimensão da notícia e aos textos curtos”, afirma Vasco Ribeiro.

Daniel Vaz