Rui Trindade considera que ainda nada se fez para resolver os problemas pedagógicos do ensino superior.

“Do ponto de vista pedagógico, no ensino superior está tudo por fazer. Acho mesmo que essa é uma questão invisível”. Rui Trindade, professor da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCE), não tem dúvidas em afirmar que “há um longo caminho a percorrer” até que se consiga potenciar uma relação mais significativa entre os alunos e o saber.

O docente não compreende como é que nos dias de hoje, o ensino superior ainda esteja ligado à “tradição feudal do professor que do cimo do seu estrado, debita a matéria toda e espera os alunos respondam o melhor possível”. Segundo Rui Trindade, “há pessoas que se sentem muito sábias e auto-suficientes” que não têm a sensibilidade de adaptar os seus métodos de acordo com os alunos que têm: “a forma como organizamos as aulas, as actividades, os desafios, o apoio e a forma de avaliação são coisas que nos outros níveis de ensino são discutidas há muitos anos e no ensino superior simplesmente não é”.

Outros dos problemas apontados, tem a ver com a falta de preparação alunos recém-chegados do ensino secundário de que os professores universitários tanto se queixam. Rui Trindade acha que isso não passa de uma “discussão de má-língua” e vai mesmo mais longe: “nunca ninguém está preparado. É uma coisa bestial. Se repararmos, todos falam da má preparação dos alunos, no superior, no secundário, no 3º ciclo, no 2º ciclo, e até no 1º ciclo já começam a queixar-se do jardim-de-infância”.

O docente da FPCE considera essencial a discussão sobre o perfil desejado de um aluno que vem do secundário, e se é algo que um professor do ensino superior tem de resolver. “é preciso clarificar qual o perfil desejável e saber o que esperamos que os alunos atinjam e tomar as decisões necessárias”. Rui Trindade acha que definindo competências para os alunos o problema será contornado, mas o pouco interesse em discutir esta questão não tem ajudado.

O professor aponta a questão pedagógica como essencial para o ensino superior e refere que também os professores podem contornar a tão falada má preparação dos alunos. “A função do professor também é ter consciência da nova informação que os alunos vão ter e só com o desenvolvimento das competências e saberes dos alunos é que eles vão poder progredir”, afirmou.

Para Rui Trindade, o problema da falta de preparação também está na forma como se estruturou o ensino secundário em Portugal: “o ensino secundário é um problema grave neste país, um cancro, que atinge principalmente os alunos bem sucedidos”. O facto dos alunos se preparem apenas para terem boas notas nas médias e nos exames, leva a que tenham “uma relação acrítica com o saber, despejando informação sem pensar sobre ela”.

O docente acredita que “este problema terrível pode ser remediado se o ensino secundário for pensado de uma maneira mais inteligente e mais culta”. Mas deixa uma questão: “se assim fosse, será que os professores do ensino superior não seriam também os primeiros a fazer barulho”?

Falta de cooperação entre professores

A questão colocada pelo professor refere-se a um certo comodismo e que alguns professores mostram, sem ter atenção aos problemas que os rodeiam. “É sempre a velha história, os problemas são sempre dos outros. Temos de perceber até que ponto um problema nos diz respeito e sermos solidários entre todos”, afirmou.

Rui Trindade defende que preciso um trabalho conjunto, em parceria, que seja pensado em concreto e aplicado activamente. Só desta forma é que os docentes vão saber ultrapassar os obstáculos com que se debatem, de forma a optimizar “a forma como utilizamos os meios, como os trabalhamos e como pensamos a sua relação com aquilo que fazemos”.

Bruno Amorim