J.P. Simões é homem de muitas palavras. Divide-as entre os Belle Chase Hotel e o Quinteto Tati. Aproveitando o facto destes últimos estarem presentes hoje à noite no bar Tertúlia Castelense, na Maia, falámos com um homem que tem quase tanto passado como futuro. Cheio de metáforas e de talento. E garante que só agora foram convidados para vir ao Porto, um ano depois do lançamento de “Exílio”…

O que é o “Exílio”?

É a triste condição. Andar para aqui 99% do tempo em mal-entendidos e a fazer um esforço danado para encontrar um ponto de construção, da nossa visão do mundo, da nossa esperança e da nossa capacidade de a comunicar aos outros. Isso é o exílio. Vivemos num sítio cheio de equívocos. Particularizando, vivemos num período muito difícil para mim, para o Sérgio, para as pessoas com quem trabalhamos. Mesmo o estado do país. Isto de facto é um lugar inóspito para se viver. É um país belíssimo, com um clima fantástico, mas todo ele é cuspido, num individualismo selvagem, assustador. Mal mergulhas no hipnotismo doce de uma canção, ou és um grande totó ou tens consciência de que todas as tuas construções só têm sentido no mundo mais ou menos virtual da criação.

Porque é que um sexteto se chama “Quinteto”?

Nós também nunca ligámos muito às contas, no nosso país. Eu e o Sérgio Costa tínhamos a ideia de formar uma banda, depois da “Ópera do Falhado”. Queríamos cinco músicos, por isso surgiu logo o nome de Quinteto Tati. A ideia era fazer uma coisa ligada ao teatro, depois a música acabou por sair algo diferente. Mas o nome ficou, enraizou-se. Chega a ser cómico. Às vezes, chegamos a ser um decateto.

Uma curiosidade: o que é feito dos Belle Chase Hotel?

As pessoas dos Belle Chase Hotel estão todas envolvidas noutros projectos. E portanto a casa-mãe ficou adiada, estamos todos a viver em cidades diferentes como, aliás, já estávamos na altura da formação da banda. Houve muita complicação neste processo de trabalho. O que saiu pior foram as relações entre as pessoas. Foi-se criando um desafecto e um desinteresse. Mas este ano vamos dar uma data de concertos para comemorar os dez anos de carreira. Vamos aos Açores… Vamos ao Casino da Figueira da Foz, no fim deste mês.

Nos Belle Chase Hotel, as letras eram maioritariamente em inglês. No Quinteto Tati, a língua predominante é o português. Há alguma razão especial?

Nos Belle Chase Hotel, fazia sentido cantar em inglês porque éramos um pouco “vá para fora cá dentro”. As nossas raízes musicais eram tudo menos portuguesas. O processo que levou à criação do Quinteto Tati, entre mim e o Sérgio Costa, também dos Belle Chase, começou com a construção de uma ópera. Deixou de fazer muito sentido cantar em inglês. Muito naturalmente, o meu programa agora é outro. É como mudares de uma morena para uma loira. Opção estética? Não, gosto mais desta agora.

Como é que fazes com as letras? Reconhecidamente, tu não és daquelas pessoas que as escrevem à sorte…

É importante que as letras não se transformem numa récita chata. Para mim, qualquer trabalho de escrita implica sempre um processo curioso que é quase roubar ao real aquilo que ele te oferece de graça. Quando escreves uma letra, fazes uma reconstrução segundo um ponto de vista. É uma espécie de emprego reflexivo. Cada um terá o seu grau de exigência. Dá-me gozo jogar com as palavras. As letras podem ser um refúgio num sítio onde uma pessoa pode respirar de outra maneira. Tive um feedback muito engraçado por parte dos outros músicos que apreciaram bastante a viagem que eu lhes propus.

Carlos Luís Ramalhão