Saddam Hussein foi hoje, sexta-feira, posto a nú nas capas de dois jornais: no inglês “The Sun” e no norte-americano “New York Post”. O antigo ditador iraquiano é mostrado em roupa interior enquanto dobra um par de calças.

A reacção à fotografia foi imediata. Washington já prometeu uma investigação para tentar apurar responsabilidades quanto à autoria desta imagem, que mostra Saddam nas suas rotinas diárias enquanto prisioneiro. A rotina diária do antigo dirigente iraquiano foi exposta para milhões de pessoas em todo o mundo. Nas páginas interiores dos jornais, pode-se ver Saddam a dobrar umas calças na primeira página ou a lavar a própria roupa.

O “The Sun” e o “New York Post” afirmam ter recebido as fotos através de um oficial norte-americano que, contudo, não identificam. O “The Sun” cita fontes militares norte-americanas que dizem esperar que “as fotos contribuam para atingir o coração da resistência iraquiana”.

Um comunicado das forças militares norte-americanas afirma que as fotografias podem já ter um ano. Os militares adiantam, ainda, que as fotos violam directivas militares e possivelmente a Convenção de Genebra, no que se refere ao tratamento dos prisioneiros de guerra.

Entretanto, os advogados de Saddam Hussein já expressaram o seu repúdio pela publicação das imagens, que irá contra os mais elementares direitos humanos.

“Na nossa opinião, esta situação viola todos os acordos internacionais e a própria dignidade humana. Por isso, devemos processar os responsáveis por estas fotografias, porque se virmos bem podemos chegar à conclusão que elas foram tiradas dentro da prisão”, refere o advogado Ziad Khasawneth, da equipa de defesa de Saddam à Reuters.

As fotografias parecem servir um propósito bem definido: desacreditar a figura do antigo ditador de Bagdade.

Estratégia de propaganda

“Ou é uma estratégia do departamento militar norte-americano ou, se não o é, será ainda mais grave porque mostra como uma coisa desta envergadura escapa à alçada do Departamento de Defesa”, comenta Luís Santos, professor do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho (UM).

O professor, embora confesse ainda não ter visto a foto de Saddam, adianta que este caso parece ter muitas semelhanças com o anterior episódio na prisão de Abu Ghraib, onde se mostraram fotos de abusos infligidos aos detidos pelas tropas norte-americanas.

Luís Santos afirma que, na sua óptica, “uma fotografia com uma personalidade como Saddam nesta postura tem intrinsecamente valor noticioso. O problema é como ela é apresentada e enquadrada”, diz. No entanto, as capas do “The Sun” e do “New York Post” parecem contribuir mais para uma abordagem de puro entretenimento. “Se a foto viesse enquadrada por um texto que se referisse ao contexto de Saddam na prisão, como ele é tratado, teria certamente outra expressão. Assim sendo, é mais um exemplo de jornalismo gratuito”, afirma o professor da UM. Luís Santos ressalva que “convém admitir a hipótese de fotomontagem”.

Entre as muitas hipóteses que este caso levanta, o facto de poder ser um simples exemplo de propaganda também é avançado pelo professor da UM. “Se isso é uma estratégia deliberada para afectar a moral dos grupos terroristas convém questionar porque é que o ‘The Sun’ foi o veículo desta camapanha”, diz.

Ambos os jornais são propriedade do barão dos “media” Rupert Murdoch que, durante a intervenção americana no Iraque se posicionou, deliberadamente, a favor da posição de George W. Bush.

Mariana Teixeira Santos
Foto: Floogie