Não se sabe bem o que terá atraído as 50 mil pessoas que passaram por Serralves este fim-de-semana: se foi o cartaz proposto, o carácter único da festa ou a oportunidade de visitar os jardins, o museu e ver outros espetáculos sem ter que pagar.

O certo é que, depois do sucesso do ano passado, o evento “Serralves em Festa”, que celebrou o 16º aniversário da Fundação, conseguiu atrair pessoas das mais diversas origens, durante as 40 horas “non stop” de eventos culturais.

Cinema, música, dança, teatro, debates, “workshops” e visitas guiadas foram as propostas. E o público aderiu. O museu de arte contemporânea esteve sempre muito concorrido, os espetáculos sempre cheios e os jardins sempre repletos de pessoas a passear, a descansar ou simplesmente para dar uma volta, assistindo e ouvindo um pouco de tudo o que se ia passando por lá.

A romaria

Cinco da tarde de sábado. Parecia uma romaria, mas sem a música pimba e sem os carrinhos de choque. De resto estava tudo lá. Música, animação, actividades para todos e pessoas de todas as idades e proveniências, pelo menos a julgar pelas aparências.

A esta hora, a companhia “Chant de Balles” dava um espectáculo de malabarismo no parque. Estava cheio. Alguns fascinados com as brincadeiras de Vicente de la Lavenère com as bolas amarelas que ia atirando ao ar, apanhando outra vez, por baixo das pernas, por detrás das costas, ao ar outra vez, e mais uma vez apanhá-las com a outra mão, num exercício de coordenação que não se sabia possível. Outros só queriam estar na sombrinha, deitados na relva, a ver quem passava.

A Mingus Big Band, banda de jazz que veio de Manhattan, encheu a tenda de circo montada no Prado. Do lado de fora da tenda também se estava muito bem. Centenas de pessoas circulavam por ali, entre a relva e as barracas da cerveja.

Surpreendemos Joana Silva, uma senhora que estava sentada na relva a ler uma revista, ao lado do carrinho de bebé onde a sua filha dormia. “Está muito mais animado do que no ano passado e muito melhor organizado”, sentencia. “Acho que Serralves está a fazer um trabalho muito importante para aproximar as pessoas da cultura. Abrir isto um fim de semana inteiro, trazendo pessoas de todos os lados e de todas as faixas sociais, é muito interessante”.

Mas então onde anda toda esta gente resto do ano? “Penso que há muitas coisas a acontecer, mas acho que a cultura não vem de encontro às pessoas. Funciona tudo muito em circuito fechado, é preciso frequentar certos sítios para se saber o que está acontecer”, observa.

Um outro casal concorda: “Quando há espectáculos bons os sítios enchem. Mas aqui no Porto fazem coisas demasiado elitistas”, acusam Pedro Salazar e Inês Alves.

É claro que o facto de todos os espectáculos serem grátis também ajuda. Rui Miranda, que vive em Lisboa, mas é do Norte, é da opinião que o facto de não ser necessário pagar para ver “é uma forte motivação”, mas não deixa de lembrar, contudo, que se “as coisas forem bem organizadas e bem divulgadas as pessoas reagem e aderem sempre bem”. E compara: “em Lisboa há uma muito maior diversidade da oferta cultural e as pessoas procuram saber mais o que está acontecer”.

Sete da tarde. O primeiro grande êxodo do dia. Portugal joga com a Eslováquia daqui a 45 minutos. Durante a tarde o museu esteve cheio. A exposição de Álvaro Siza atraiu muitas pessoas. Às onze da noite ainda estava completamente cheia de curiosos. Assim como o bar e a esplanada do museu. Era grande a confusão nesta área, entre o museu e o auditório.

De volta ao prado: à meia-noite o fogo de artifício cativou o público, mas não os terá deslumbrado. Quando acabou começou a festa: os “Soul Jazz Sound System”, espalharam a sua mistura entre reggae, dub, funk e soul da Motown pelo prado. O ritmo era contagiante. Tão contagiante que até os mais velhos aderiram. Muitas carecas foram vistas a abanar. E muitas senhoras dançavam ao lado de gente muito mais nova.

Os “Our Aura Hour” entraram a seguir e os ânimos acalmaram. Já passava das três da manhã. Mesmo assim, as filas para as senhas das bebidas continuavam como no resto da noite: longas e lentas. A animação foi assegurada a seguir pelos “Tigersushi Bass System”. A festa durou até às seis da manhã.

“Isto até parece a festa de ‘S. Serralves’”, disse-nos João Sousa, confirmando a sensação de que a festa parecia uma romaria, mas “com mais pinta”. E ainda faltavam mais 12 horas de teatro, música, dança, circo, cinema e debates.

50 mil pessoas passearam por Serralves durante o fim de semana, para assistir a mais de 50 eventos. ”Espero que para o ano haja mais”, continua João Sousa. “Eventos como este fazem mesmo muita falta ao Porto”.

Miguel Conde Coutinho
Foto: Serralves