A ETA anunciou hoje, quarta-feira, em comunicado [RTF], um cessar-fogo “permanente”, a partir de 24 de Março, depois de mais de trinta anos de luta armada pela independência do País Basco.

“O objectivo desta decisão é impulsionar um processo democrático em Euskal Herria [País Basco] para construir um novo marco no qual sejam reconhecidos os direitos que, enquanto Povo, nos correspondem, e assegurar para o futuro a possibilidade de desenvolvimento de todas as opções políticas”, explicava-se no comunicado.

O texto apelava também às autoridades espanholas e francesas para que “respondam de maneira positiva a esta nova situação, deixando de lado a repressão”.

Os vários quadrantes políticos espanhóis, excepto o PP, reagiram positivamente ao comunicado da ETA. Numa sessão do Parlamento, o primeiro-ministro, José Luis Zapatero afirmou que se até aqui os partidos políticos espanhóis estavam
“unidos na dor” agora estão “unidos na esperança”.

O líder do PP, Mariano Rajoy, segundo a edição “online” do “La Vanguardia“, afirmou que o comunicado da ETA não vai longe o suficiente e que só um anúncio de dissolução da organização e do “fim das suas actividades criminosas” seria mais do seu agrado. O líder do maior partido da oposição disse, ainda, que neste comunicado a ETA apenas “relembra quais são os seus objectivos” e “impõe as suas condições”.

Na resposta, Zapatero explicou que a participação do PP num processo que leve ao fim da violência é “essencial”, já que é um partido com uma enorme representatividade junto da população espanhola. Rajoy, por seu lado, garantiu o seu apoio ao Governo “para que não pague um preço político, para apoiar as vítimas e para que o Estado de Direito continue a funcionar”.

“Não há um problema basco, mas sim espanhol”

O jornalista Rui Pereira, que passou vários anos no País Basco enquanto correspondente do semanário “Expresso”, vê este cessar-fogo como ambíguo, por ser chamado de “permanente”. “Não é definitivo”, explica, “nem é como o anterior [de 1998 que durou 14 meses] que era indefinido”.

Autor do livro “Euskadi – A Guerra Esquecida dos Bascos”, o jornalista esclarece que este comunicado “resulta de uma negociação que dura há muito tempo”, acreditando mesmo que as negociações, “discretas”, já tenham vindo a ter lugar desde antes das eleições de 2004 que deram a vitória ao PSOE de Zapatero.

Na opinião do jornalista, “não há nenhum problema basco”, nem catalão, nem andaluz, nem galego. O que existe, na realidade, é “um problema espanhol”, que parte de uma “entidade questionada e questionável”. A longo prazo, afirma, a questão basca não pode ser resolvida sem uma alteração à Constituição espanhola, para que esta passe a reconhecer a auto-determinação dos povos. “Isto é um processo a anos de distância”, explica Rui Pereira.

Em relação ao Partido Popular espanhol, Rui Pereira diz que no PP existe uma “falta de deslocação política”, já que o partido continua a representar a “velha Espanha integrista”. Para o jornalista português “é impensável a dissolução de uma organização como a ETA”, devido às 700 pessoas suspeitas de pertencerem ou de colaborarem com a organização independentista basca, que estão presas em cadeias espanholas e que têm de fazer parte das negociações.

Rui Pereira lembra que apesar do cessar-fogo ser “permanente”, isto “não significa que não haja armas”. Significa apenas “que não estão a ser disparadas”.

Tiago Dias