Num auditório da Faculdade de Letras do Porto (FLUP) apinhado de gente de todas as idades, o escritor Mia Couto trocou ideias e confissões com os seus admiradores. O mote foi o lançamento de “O outro pé da sereia”, o seu novo livro, que narra histórias de viagens que se entrecruzam.

Grato por estar no Porto, o autor moçambicano confessou ter sempre “uma sensação de regresso” quando vem à cidade Invicta. Neste caso, “regresso a uma geografia de afectos e a um momento que tem a ver com a sala de aulas”. Mia Couto tem familiares no Porto e já deu aulas no seu país.

Questionado sobre a existência ou não de uma “africanidade literária”, o escritor, que se assume como um homem de contradições, diz que “existe e não existe”. Existe porque “há qualquer coisa que identifica um autor como sendo africano”. E não existe porque as identidades de cada ser humano são mutáveis e “viajar pelas identidades é uma possibilidade de ser feliz”. Mas admite: “eu não escreveria o que escrevo se não tivesse vivido a minha vida em Moçambique”.

Falando sempre de igual para igual com a plateia, respondendo de forma descontraída às perguntas e tímida aos elogios, o autor moçambicano abordou ainda aqueles que considera serem os aspectos positivos e negativos da sua profissão. “[Um escritor] tem de ser mercado, o que implica fazer as acções de promoção que estou a fazer. Quando se é escritor compra-se a dose toda”, diz.

Mas ser escritor, para Mia Couto, é também uma forma “de prazer e de trabalho”. É ainda (nunca o diz taxativamente, mas deixa transparecer) uma forma de “ser feliz, estranharmo-nos e sermos estranhados por nós mesmos”. “Se alguma coisa me agrada na escrita, é a possibilidade de ser outro”, diz o escritor, indo de encontro à ideia de que a identidade é algo que se procura, é um caminho e não algo permanente.

Antes da sessão de autógrafos por que os admiradores ansiavam, o autor teve ainda tempo de explicar o que pretende com “O outro pé da sereia”: “A minha intenção é fazer poesia, contar uma história de uma forma poética”. Tal como fez em livros anteriores.

Texto e foto: Andreia C. Faria