A reeleição de Mari Alkatiri (na foto) como secretário-geral da Fretilin vai conduzir o partido à derrota nas próximas eleições legislativas, disse hoje José Luís Guterres, o candidato que ontem desistiu da corrida à liderança, depois da aprovação em congresso da proposta que define a eleição do líder por braço no ar, em vez de voto secreto.

“Mari Alkatiri não tem condições para levar a Fretilin a uma nova vitória eleitoral,” disse José Luís Guterres à Agência Lusa, no último dia do Congresso da Fretilin. ” Há previsões de que ele não terá a maioria necessária para governar, desde logo porque ele aceitou ser eleito por braço no ar”, adiantou Guterres, o actual embaixador de Timor-Leste em Washington e chefe da missão diplomática timoren se da ONU.

O primeiro-ministro timorense Mari Alkatiri, actual secretário-geral da Fretilin, voltou hoje, sexta-feira, a ser eleito, com 93,7% dos votos.

Para Barbedo Magalhães, especialista nas questões de Timor, Mari Alkatiri seria eleito líder da Fretilin, independentemente da desistência da José Luis Guterres. “Com voto secreto ou sem ser secreto, o que havia era uma lista de apoiantes da liderança de Mari Alkatini, o actual presidente da Assembleia da República de Timor, que detinha uma maioria esmagadora dos delegados do partido”, disse ao JPN. “Admito que tenha sido essa a principal razão”, acrescentou.

“A situação, de facto, caiu num relativo caos, talvez pela pouca eficiência da polícia e o que acontece é que os meios de comunicação não são os ideiais e nem sempre é fácil para o primeiro-ministro encontrar o Presidente da República. Portanto, há factores circunstanciais que são reais”, afirmou Barbedo Magalhães, autor de vários livros sobre Timor.

O especialista referia-se às recentes acusações por parte do número dois da hierarquia militar, major Reinado, de que foi Mari Alkatiri quem ordenou “oralmente” e sem o conhecimento do Presidente da República timorense, a intervenção do Exército, durante as manifestações dos militares peticionários dos dias 28 e 29 de Abril.

Legislação “transparente” na origem da instabilidade

Para o especialista, o que está por trás das sucessivas crises em Timor-Leste desde a conquista da independência em relação ao domínio indonésio é a “legislação, que é do melhor que há no mundo, sobre os recursos resultantes do petróleo”. A lei, diz, é de uma “transparência realmente excepcional, que torna muito difícil os abusos e a corrupção. E, naturalmente, quem está habituado a resolver tudo pela via da corrupção, quer Estados, quer companhias, não gosta dessas coisas”.

Segundo Barbedo Magalhães, este é um problema comum em “países jovens”, como é o caso de Timor-Leste. A recente instabilidade política e social, potenciada pelos confrontos entre os militares “peticionários” e o Exército, provocaram a fuga em massa da população da capital Díli, para o interior do país. Uma reacção que para Barbedo Magalhães é perfeitamente compreensível à luz da história timorense: “Os timorenses estão traumatizados por 24 anos de ocupação e, portanto, é natural que fujam de Díli quando ouvem tiros, como fugiram noutras ocasiões”.

Timor “é um país que nasceu literalmente das cinzas”, lembra o especialista. “Há toda uma aprendizagem que eu julgo que os órgãos de soberania e o próprio povo timorense estão a fazer e que demora o seu tempo”. Mas apesar de a situação ser “delicada”, “as coisas podem voltar à normalidade”, “havendo diálogo entre as várias partes, como tem havido”.

Inês Castanheira
Foto: FMI