João Lagarto traduziu e agora leva à cena e interpreta “Começar a acabar”, um monólogo de Samuel Beckett, no centenário do nascimento do dramaturgo e escritor irlandês. A peça, que esteve no Teatro Nacional D. Maria II desde Setembro, está até o próximo domingo no auditório da Academia Contemporânea do Espectáculo (ACE)/Teatro do Bolhão, no Porto.

O monólogo, que estreou pela primeira vez em 1970, é a junção de três narrativas do escritor e tem como tema principal a inevitabilidade da morte.

O texto começa com a frase “Em breve estarei morto finalmente apesar de tudo”. Todo o discurso que se segue é o de um homem prestes a morrer e que tenta percorrer a história da sua vida, o seu passado e, sobretudo, os seus fantasmas.

As palavras saem em torrente, sem sentido. João Lagarto explica: “São palavras. E essa é uma das chaves para entrar em Beckett: dizer palavras, mesmo quando não se sabe exactamente o que se está a dizer”.

O actor está sozinho em palco, com roupas rasgadas e poierentas. No palco para além dele existem apenas três lâmpadas que acentuam o dramatismo do relato. “Beckett é deprimente. Deprimentíssimo. Mas também diz que a coisa mais divertida é o sofrimento”, afirma João Lagarto.

Se a morte é um tópico trágico, a intenção do autor, e em última instância do actor, é também a de fazer rir. Beckett pediu “o máximo de gargalhadas”. E é isso a que João Lagarto aspira.

Aos momentos em que lembra histórias banais, seguem-se pausas de introspecção profunda em que o homem prestes a morrer se queixa da vida, da falta de amor e da solidão.

O espectáculo dura cerca de uma hora mas o ritmo alucinante e caótico do discurso, típico de um homem que espera impacientemente pela morte, prende o espectador até ao último segundo.

Samuel Beckett, Nobel da Literatura em 1969, é um autor incontornável na história do teatro do século XX.

Joana Almeida Silva
Foto: Arquivo JPN