São conclusões de um estudo publicado esta quarta-feira na revista “Archives of International Medicine“: mais de 30 mil soldados dos Estados Unidos sofreram efeitos psicológicos nefastos causados pelas guerras do Afeganistão e do Iraque.

O estudo refere que um quarto dos combatentes norte-americanos atendidos pela Segurança Social e que estiveram destacados para os conflitos no Afeganistão e no Iraque tem indícios de patologias mentais. Se ao rol das enfermidades se juntarem outros males como a violência doméstica, a percentagem de soldados afectados por problemas mentais sobe para 31%.

Para além destas conclusões preocupantes, o mesmo estudo, realizado por cientistas da Universidade da Califórnia e do Centro Médico de Veteranos de San Francisco, diz ainda que mais de metade dos combatentes (56%) denuncia mais de uma doença mental. A pesquisa enuncia que cerca de um terço dos militares visados foi submetido a tratamentos por fragilidades de foro psíquico.

Os veteranos apresentam problemas relacionados com consumo de estupefacientes e distúrbios de stress pós-traumático, entre outras questões de cariz psiquiátrico. Grande parte destes soldados esteve sob luta intensa contra a actividade de guerrilha, além da exposição à ameaça permanente de engenhos explosivos.

A investigação contemplou 103.788 veteranos dos conflitos do Iraque e do Afeganistão num intervalo de tempo compreendido entre 30 de Setembro de 2001 e 30 de Setembro de 2005.

A 31% dos soldados foram diagnosticados problemas mentais ou psico-sociais. A maior parte padecia de síndroma pós-traumático, o que, de acordo com o estudo, representa cerca de 52% de todos os membros das Forças Armadas com problemas mentais que regressaram de ambos os conflitos.

Cerca de 29% dos regressados do Iraque e do Afeganistão requereram cuidados médicos especiais para antigos combatentes, um valor bastante superior ao valor registado pelos veteranos do Vietname, que rondou os 10% .

Tratamento e mentalidades evoluiram positivamente

Para Adelaide Oliva Telles, psicóloga da Universidade do Porto, não existe uma receita para superar traumas, visto existirem diversos tipos de problemas e cada caso ser um caso.

“Há muito tipos de sequelas associadas a traumatismos: muitas pessoas ficam muito sensíveis a ruídos, outras ficam com medo do escuro, outras alteram totalmente o processo de sono. Pesadelos, problemas de memória também são frequentes nos retornados. Por isso, é complicado ajudar pessoas que sofreram situações tão violentas como as que são vivenciadas em contexto bélico”, afirmou ao JPN.

As consequências de uma experiência tão atroz como uma guerra são sempre inesquecíveis. Como sublinha a psicóloga, “as guerras são sempre situações desumanas e raramente se lida bem com elas. Por muito preparadas que as pessoas estejam, ter de matar para não morrer nunca é uma situação fácil de lidar. No ‘pós’ ainda é pior: já não há ambiente de conflito, mas persistem os sentimentos de culpa”.

De acordo com Adelaide Telles, a sociedade evoluiu favoravelmente à reintegração dos retornados. “Agora estamos muito mais receptivos. Antes havia muito maior isolamento, as pessoas receavam dizer que não conseguiam dormir, que tinham vontade de chorar, que tinham medo. O homem que ia para a guerra tinha de ser valente”.

A psicóloga salienta a evolução no diagnóstico e no tratamento e também nas mentalidades. “Há 50 anos nem havia consultas de pós-traumático. Hoje as pessoas têm muito menos dificuldades em pôr os problemas na mesa”, aponta.