Cerca de 1,6 milhões de portugueses sofre de dor crónica moderada ou forte, revelam os resultados preliminares do primeiro estudo epidemiológico sobre dor crónica realizado em Portugal. Assinala-se esta quinta-feira o Dia Nacional de Luta Contra a Dor.

Os números do estudo, desenvolvido por investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), serão apresentados esta quinta-feira, no Porto Palácio Hotel, na abertura do Congresso Multidisciplinar de Dor, organizado pela Associação Portuguesa para o Estudo da Dor (APED).

Mais de 40% dos adultos portugueses sofrem de dor crónica de qualquer intensidade, mas a intensidade da dor era moderada ou forte em cerca de 16% dos 1.200 entrevistados (o estudo total compreenderá 5.000 entrevistas). O número é “ligeiramente abaixo da média europeia”, mas “pior do que o de Espanha” (11%), disse ao JPN José Castro Lopes, professor da FMUP e coordenador da investigação.

Lombalgias (dores de costas), artrites ou artroses, cefaleias (dores de cabeça) e problemas de coluna são as queixas mais frequentes de quem tem dor crónica.

“Era importante conhecermos a nossa realidade”, explica Castro Lopes, que é também presidente da APED. “Tem efeitos muito importantes no aspecto psicológico, como ansiedade, isolamento dos familiares e amigos. Em casos extremos, pode chegar ao suicídio”.

Efeitos psicológicos e económicos

Em Portugal, a dor crónica, ou seja, aquela que persiste durante pelo menos seis meses, tem importantes efeitos psicológicos e socioeconómicos. Mais de metade dos portugueses com dor crónica referem que a dor interfere com o trabalho e vida doméstica. Em 15%, a dor levou-os a pedir a reforma antecipada. A 13% dos doentes foi diagnosticada depressão e 30% disseram-se “tristes”.

É particularmente grave a escassez de unidades de dor aguda pós-operatória, diz Castro Lopes

O que estes resultados preliminares “ainda não permitem saber são as consequências socioeconómicas da dor: quer os custos directos, com terapêuticas, visitas aos médicos; quer os custos indirectos, de perda de produtividade, absentismo e reformas antecipadas, que têm custos muito altos para a economia do país”, refere o coordenador da análise.

Metas por cumprir

O presidente da APED lembra que o Plano Nacional de Luta Contra a Dor [PDF], implementado em 2001 e que termina este ano, não atingiu as metas propostas.

Era objectivo da Direcção Geral de Saúde conseguir que 75% dos hospitais públicos tivessem unidades de dor. Hoje 60% das unidades hospitalares têm este equipamento, um “avanço considerável em relação a 2001 [havia 35%] mas que não chega à meta”, aponta.

Mais grave, para Castro Lopes, é a escassez de unidades de dor aguda pós-operatória. “Não sofreram qualquer aumento nos últimos anos, o que é bastante negativo porque sabe-se quando vai acontecer e como se deve proceder”, constata.

Rede de referenciação

No novo plano (válido até 2017), que o investigador ajudou a preparar, não vão existir metas tão definidas. O documento defende a formação de médicos e dos próprios doentes, que devem ser tratados primeiramente pelos médicos de família e só em casos mais graves pelas unidades de dor. Será ainda criada uma rede de referenciação dos doentes com dor crónica.

O presidente da APED defende ainda uma maior comparticipação dos medicamentos analgésicos – em Portugal é apenas de 40%, enquanto na generalidade dos países europeus é de 100%. No entanto, Castro Lopes está optimista quanto à alteração da situação, porque há uma proposta do Infarmed para aumentar para 95% a comparticipação dos medicamentos opióides.