Quase 40% dos médicos oncologistas portugueses defende a legalização da eutanásia. É o que revela a tese de mestrado do médico Ferraz Nunes, pioneiro dos cuidados paliativos em Portugal, que atesta uma tendência de crescimento da legalização da prática entre a comunidade médica portuguesa.

Os números “são uma surpresa”, disse ao JPN Rui Nunes, orientador do estudo e director do Serviço de Bioética e Ética Médica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e da Associação Portuguesa de Bioética (APB).

Uma “surpresa”, por um lado, porque “a ética médica tradicional sempre se manifestou contra” a eutanásia; por outro lado, e ainda mais surpreendente, porque os oncologistas são médicos que “lidam com o cancro e doenças terminais”, diz Rui Nunes, que se opõe à legalização da eutanásia.

Só existem sete unidades de cuidados paliativos em Portugal

Aprovada na passada quarta-feira, o estudo foi feito através de inquéritos enviados a 500 oncologistas portugueses. Ferraz Nunes recebeu 200 respostas, 39% das quais favoráveis à legalização da eutanásia.

Outros números de relevo: 20% dos médicos admitiram que praticariam a eutanásia se ela fosse legal, 5% já receberam pedidos para praticar suicídio assistido e 20% para praticar eutanásia.

O documento será entregue até ao final da semana ao ministro da Saúde, Correia de Campos, e ao presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.

“Grito de alerta”

Rui Nunes encara os resultados como um “grito de alerta quanto à falta de meios do nosso sistema de saúde”, em particular no que diz respeito aos cuidados paliativos, que têm sido alvo de uma “falta de atenção” por parte dos sucessivos governos. Caso a situação não se inverta, o director da APB receia que o número de médicos favoráveis à eutanásia aumente.

Só existem sete unidades de cuidados paliativos no país, “manifestamente pouco para 10 milhões de habitantes”, ilustra.

O responsável defende a criação de uma rede deste tipo de equipamentos bem como a implementação do “testamento vital”, um instrumento que permite aos doentes recusar, enquanto lúcidos, certas operações médicas em caso de perda de consciência, como ficar ligado a um ventilador.