São 00h58 quando a embarcação “Mãe Puríssima” inicia a sua longa jornada de 17 horas em alto mar. José Manuel Festas é o mestre interino do “Mãe Puríssima”, ocupando o lugar de mestre quando o seu pai, José Festas, tem assuntos importantes para tratar em terra.
No alto mar com os pescadores:
Parte 1: “Se tiver que morrer no mar, morro feliz”
Parte 2: O lançamento das redes
Parte 3: As carícias do oceano
Parte 4: Quando o mar e a terra se “juntam”
A comunidade piscatória das Caxinas, Vila do Conde, uma das maiores do país, perdeu nos últimos 26 anos 79 vidas no mar. Mas “Zé Manel”, como é chamado entre os tripulantes, um jovem de 23 anos, não tem medo de morrer no mar: “A vida é assim, tudo o que tiver de acontecer acontece onde nós estivermos. Até na cama se morre. Temos noção do perigo”. “Se tiver que morrer no mar, morro feliz”, remata.
À saída do Porto de Matosinhos, o “Mãe Puríssima” cruza-se com alguns cargueiros e petroleiros. O barco acelera a velocidade, saboreia o galopar das ondas – dirige-se para o largo de Matosinhos e Peniche. O mestre continua no seu posto enquanto os seus homens fazem os últimos preparos para a pescaria no exterior da embarcação. O barulho ensurdecedor do rádio rompe com a acalmia então vivida.
No alto mar, parece que o tempo teima em não passar
Zé Manel tem que orientar, manobrar, controlar a largada e a manobra de recolha das redes – é uma espécie de encarregado ou chefe. Este jovem mestre tem de controlar uma panóplia de instrumentos, desde a sonda para verificar a profundidade do fundo do mar a rádios intercomunicadores de onda curta e média. Mas a pérola desta embarcação é o programa informático MaxSea, que indica as rotas a seguir.
Pela noite dentro
A tripulação do “Mãe Puríssima” é constituída por sete homens, que vão para o mar todos os dias ficando em casa ao sábado e domingo. Zé Manel conta que algumas vezes ficam cerca de 17 dias em alto mar sem avistar terra, quando vão para Peniche.
01h35. A noite corre devagar. Os homens vão para os seus camarotes descansar um pouco antes de lançar as redes ao mar. O mestre continua firme no seu posto de comandante dos destinos do “Mãe Puríssima” – não vai dormir, prefere passar alguns “sacrifícios, como não descansar durante 20 horas seguidas, para ver o pessoal a descansar”.
No alto mar, o tempo teima em não passar e Zé Manel procura ajuda na televisão. “Costumo passar o tempo como dá mais vontade. Às vezes sento-me a olhar para o nada; noutras vejo televisão, quando dá alguma coisa de jeito; ou jogo às cartas no computador”. A conversa também ajuda a passar o tempo.
Zé Manel nunca passou por nenhum aperto no mar. “Graças a Deus nunca tive momentos de perigo. Sempre tivemos bons barcos para os tipos de temporais que temos na costa portuguesa.” Mas conta, com desalento, que apesar de o Outono suave, “a calma não é boa, porque o peixe fica parado”.