É Inverno, e os doentes e um jovem médico de um asilo psiquiátrico, algures nos Balcãs, estão entregues a si próprios. Funcionam numa espécie de “anarquia autogestionária”, diz o encenador de “O Coronel Pássaro”, Fernando Mora Ramos. Esta “tragicomédia burlesca” estreia esta quinta-feira no Teatro Carlos Alberto (TeCA), no Porto, onde fica até domingo.

“Regressam laços de solidariedade. Refaz-se uma espécie de nova realidade, pré-nacional, pré-estatal”, algo a que se poderia chamar de comunismo primitivo, prossegue o encenador do Teatro da Rainha. “Cada um é maluco à sua maneira e traz o seu contributo”, refere. Entre o grupo, há um mudo, um surdo e um cleptomaníaco.

Mas tudo se altera quando um avião da ONU atira alimentos e uniformes militares por engano para o antigo convento onde os doentes mentais estão instalados. Fétissov, um dos pacientes, ex-coronel do exército russo, até então totalmente mudo, passa a falar e organiza um pequeno exército. Um objectivo: integrar a União Europeia, vista como um “El Dorado”. A loucura permanece: o “exército” tenta comunicar com Estrasburgo através dos pássaros.

Para José Carlos Faria, responsável pela cenografia e figurinos, a sala do TeCA tem condições “quase ideais” para esta peça. “O público está sentado como se estivesse na sala de espera daquele hospital”, refere. Sobre o texto de Boytchev, diz ser “de uma espantosa teatralidade”. “Não há propriamente papéis principais. É uma trama extremamente bem urdida”.

Fábula política

“O Coronel Pássaro” foi escrito entre 1995 e 1996 pelo búlgaro Hristo Boytchev. Levar a peça ao palco do TeCA tem também um significado político que Fernando Mora Ramos assume. Afinal, esta “fábula também é nossa”, país da União Europeia.

“Está aí a rebentar o Quadro de Referência Estratégico Nacional”, que, para o encenador, “representa uma clara dependência de um centro de poder que é muito difícil de perceber”.

Uma fábula que também se aplica ao acto de fazer teatro em Portugal e particularmente no Porto. Fernando Mora Ramos evoca a concessão do Rivoli a Filipe La Féria. “De repente, estamos em plena resistência. O teatro é como os loucos na história. A sua diferença não é totalmente compreendida”.

Tecendo críticas a todos os que lideraram o Ministério da Cultura, “com excepção talvez de [Manuel Maria] Carrilho”, conclui: “Eu sou tão maluco como o Fétissov”.

“O Coronel Pássaro” estreia esta quinta-feira. Até sábado, sobe ao palco sempre às 21h30. No domingo, último dia de exibição no TeCA, começa às 16h00. Os bilhetes para a plateia e tribuna custam 15 euros.