O realizador de “Elephant”, “O Bom Rebelde” e “Last Days” adaptou o livro de Blake Nelson com o mesmo nome do filme, para contar a história de Alex, um adolescente skater que mata, por acidente, um segurança de uma estação ferroviária.

O resultado é “Paranoid Park”, vencedor do Prémio 60º Festival Cannes e nomeado para a Palma de Ouro. O filme estreia hoje, sexta-feira, nos cinemas Cidade do Porto e no Monumental Saldanha, King e Fonte Nova, em Lisboa.

O papel principal é desempenhado por Gabe Nevins, um nome ainda desconhecido. Como a maior parte do elenco, Gabe é um actor amador. Mas a novidade é que, para além de amadores, os actores foram seleccionados através da rede social na Internet MySpace. Em entrevista publicada no site oficial do filme, o realizador considera que este é o método que todas as agências deviam utilizar para encontrarem estudantes para participarem em filmes.

Por trás das câmaras, Gus Van Sant contou com a colaboração de Cristopher Doyle, com quem já trabalhara em “Psycho” (remake do original de Hitchcock). A fotografia ficou a cargo deste cineasta, aclamado frequentemente pela sua participação em filmes de Wong Kar-Wai.

Sonho dos adolescentes

A história é de Blake Nelson, mas a estrutura é de Gus Van Sant. Através de uma lógica narrativa não linear, saltando para trás e para a frente no tempo, o espectador entra, aos poucos, no íntimo de Alex, até perceber o que se passou naquela noite em que foi até Paranoid Park, um parque onde se juntam jovens skaters de Portland, Estados Unidos.

Elliot Smith, de novo

Depois do sucesso da música “Miss Misery”, na banda sonora d’ “O Bom Rebelde” (1997), Gus Van Sant volta a apostar em Elliot Smith, agora já falecido, com temas como “Angeles” e “The White Lady Loves You More”. A banda sonora reúne ainda Nino Rota, o habitual colaborador de Fellini, e Ethan Rose.

O parque é mal frequentado e perigoso, mas é, também por isso, que o sonho de qualquer adolescente é estar à altura de o frequentar.

“Nunca ninguém está pronto para o Paranoid Park”, diz, a certa altura, um amigo de Alex. E, de facto, Alex não estava pronto para o que lhe iria acontecer nessa noite em que se dirigiu até ao parque de skate. Depois da morte macabra do segurança, o adolescente decide não contar a ninguém, esperando que as imagens deixassem de o assombrar.

À maneira de Hitchcock

Gus Van Sant leva o espectador a explorar a forma como o adolescente lida com a culpa, revelando o dilema moral que, à primeira vista, parecia não existir. O julgamento do rapaz é feito pelo próprio espectador, à maneira de Hitchcock.

Este julgamento é, obviamente, conduzido pelo realizador: a montagem e a música constroem momentos que transbordam tensão e que reflectem a perturbação de Alex. É de realçar a cena do duche, com “Walk Through Resonant Landscape”, de Francis White, como música de fundo, uma das sequências mais intensas do filme.

Paranoid Park” fecha-se num espaço físico (Portland) e, sobretudo, psicológico (Alex). Ainda assim, houve lugar para referências ao “mundo lá fora”. As várias alusões à Guerra do Iraque contrastam com a indiferença dos adolescentes face a assuntos que extravasem o seu quotidiano.

Wendy Ide, crítica de cinema no “The Times”, sublinha que estas referências “não vão acalmar os críticos que há muito se questionam sobre o silêncio, no cinema, relativamente a um tema que domina os noticiários há quatro anos; mas já é um começo”.