O exercício que se segue merece aplausos. Márcia propõe que cada aluno crie uma melodia para depois ser repetida pelos restantes. Por instantes tornam-se compositores.

Natália dá o mote inicial. Com um triângulo de madeira, faz soar as primeiras notas. No início a confusão de notas musicais toma conta do ambiente, mas rapidamente a sintonia é estabelecida pela terapeuta. “Há sons que não estão em consonância. É preciso estar-se mais atento e saber quantas batidas temos de dar para tudo fazer sentido”, explica Márcia num tom mais sério.

Quando retoma, Natália deixa uma lágrima escorrer pela face. Mas isso não a impede de tocar. As batidas produzidas pelo batuque são intensas. O ar frágil dá lugar a uma expressão de frieza. “A Natália é uma pessoa que parece ser tímida e recatada, mas de todos é que melhor sente quando toca um instrumento”, refere a terapeuta, depois da actuação da aluna.

Depois do intervalo, o espelho

Passados 10 minutos, para um intervalo, recomeça a aula. As cadeiras e mesas são afastadas para um canto da sala. Estão todos de pé a ouvir Márcia. A técnica do espelho é o desafio que se segue. “Um exercício diferente e colorido”, descreve Alípio. O objectivo é imitar os gestos que os colegas fazem, enquanto a música toca.

A expressividade toma conta dos alunos que têm a necessidade de exprimir aquilo que sentem através da música. Tudo funciona com base no improviso. “É a melhor forma de eles exteriorizarem a necessidade de terem uma vida normal”, diz Márcia, para quem o exercício deve ser feito não só nas sessões de musicoterapia, mas na vida diária das pessoas.

As mãos erguidas constroem um ambiente ainda mais emblemático. Manuela imita João, Natália a Rosa, Rui o António, Alípio repete os movimentos da Márcia, Natália plagia Gustavo e Margarida tem como espelho Carlos. Nos rostos, a opinião unânime: prazer.

Para a semana estão de volta

Mais uma sessão está prestes a terminar. O sentimento de heróis apodera-se dos protagonistas da música, às segundas-feiras de manhã no Espaço T. Saem um de cada vez. Despedem-se de Márcia como se fosse a última vez que a vissem. Partilham com ela, ao ouvido, algum episódio da sua monótona vida na instituição.

As mesas são repostas, tal como estavam ao início. As persianas tornam a ser corridas para baixo. A luz deixa de existir. Mais uma sessão de musicoterapia chegou ao fim, talvez com a convicção que ali pode ser encontrado o início de uma nova vida.