Alain Robbe-Grillet foi teorizador e impulsionador, nos anos 50, do “nouveau roman”, uma corrente literária oposta à estética romanesca vivida em França. Morreu esta segunda-feira, devido a problemas cardíacos.

O “novo romance” caracteriza-se pela visão da arte como uma ciência que se afasta das emoções, em prol de uma ficção semifilosófica que privilegia o imaginário ao real.

Alain Robbe-Grillet formou-se em engenharia agrónoma, mas foi na literatura e no cinema que fez carreira. Entre as publicações do autor destaca-se “Les Gommes” (1953), exemplo pioneiro do “nouveau roman”, bem como “Pour un nouveau roman” (1963), considerado o manual do novo estilo narrativo. “O Ano Passado em Marienbad” (1961), o primeiro argumento de Robbe-Grillet para cinema, foi levado aos ecrãs pelo realizador Alain Resnais e premiado no Festival de Veneza com o Leão de Ouro.

Foi nessa altura que se dedicou mais à cinematografia e começou a leccionar nos Estados Unidos. Em 2004, foi eleito para a Academia Francesa e no final do ano passado publicou a sua última obra, “Um Romance Sentimental”.

“Entre Tiros”, “Encontro em Hong Kong” ou “O Ciúme” são alguns dos romances do escritor traduzidos e publicados em Portugal.

“O ‘nouveau roman’ não fez escola”

Na opinião do professor de Cultura Francesa da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), José Almeida, o legado de Alain Robbe-Grillet não se assume como um estímulo à continuidade da corrente literária. “O ‘nouveau roman’ não fez escola. É ensinado, mas tem poucos leitores. Aliás, percebe-se porquê… São essencialmente descrições pouco atractivas para o nosso público actual.”

Contudo, salienta a importância da obra no contexto francês: “a sua referência é imensa em certa literatura francesa contemporânea, nomeadamente pós-moderna que joga com os seus cânones, mas procura outra coisa”. Porém, o próprio autor “renegou a sua visão da literatura nos anos 80 com a assunção da autobiografia”.

José Almeida considera fundamental o contributo de Robbe-Grillet para a literatura francesa e europeia, “na medida em que, com o grupo do ‘nouveau roman’, acabou a ilusão da representação da realidade na ficção, nomeadamente promovendo a suspeita em relação à psicologia das personagens ou à linearidade, tão ao gosto ocidental, das narrativas.”

“Paris era o centro dessas contestações que passavam, sobretudo, pela heterodoxia artística”, o que explica, para o professor, o conhecido espírito avesso a convenções moralmente instituidas de Robbe-Grillet.

Em relação ao ensino de obras do escritor nos cursos de literatura francesa, José Almeida refere ainda que na FLUP “há sempre um ou outro romance estudado em literatura contemporânea, embora ela própria vá também evoluindo”.