Hoje é proprietária de duas lojas da empresa que um dia a discriminou. Sofia, nome fictício, recorda que foi seleccionada entre “mil e tal pessoas que eles entrevistaram”. Um dia de alegria, que se desvaneceu duas semanas depois, quando soube que estava grávida.

O facto de ter engravidado, como tanto desejava, obrigou-a a permanecer no desemprego. “Já não queriam”, diz Sofia. “Deram-me a escolher entre o emprego e o bebé, e eu optei pelo bebé”, reforça.

Sofia fala com indignação do momento de “desânimo” que atravessou. Acabou por sofrer um aborto espontâneo. Foi então que entrou novamente em contacto com a empresa, que a admitiu prontamente.

Mais estudos, mas menos emprego

– Em Portugal, segundo dados de 2005, 58% dos diplomados são do sexo feminino (em PDF)
– Dos 448,6 mil desempregados, 56% são mulheres (dados de 2007)
– A diferença salarial entre sexos situa-se nos 22,6% (2005)

Novos empregos “precários e mal remunerados”

O relato de Sofia repete-se um pouco por todo o mundo. Em Portugal, apesar dos diplomados pertencerem maioritariamente ao sexo feminino, as mulheres continuam a encontrar mais barreiras no acesso ao emprego e a ser “alvo de discriminações na promoção profissional e nos salários”, como indica o relatório “Futuro da Estratégia de Lisboa, na perspectiva do género” (em PDF), de Edite Estrela, vice-presidente da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros (FEMM).

O documento refere ainda que “os novos empregos criados para as mulheres são geralmente precários e mal remunerados”. Em consequência do desemprego prolongado e dos trabalhos sem rendimento, o sexo feminino debate-se ainda com o “risco de pobreza e de exclusão social”.

Mudança de mentalidades

Em entrevista ao JPN, Edite Estrela diz que as mulheres trabalham em casa, em média, três vezes mais do que os homens, pelo que “não têm tempo de lazer”. A vice-presidente da FEMM destaca as dificuldades das mulheres em conciliar a vida familiar com a actividade profissional, tendo em conta que a progressão na carreira é dificultada porque “há muitos patrões e muitos empregadores, inclusive na função pública, que consideram que a maternidade deve ser penalizada”. “A sociedade ainda não compreende quando uma mulher falta por causa dos filhos”, realça.

Edite Estrela defende ainda a aplicação do princípio “para trabalho igual, salário igual” e chama a atenção para a falta de “intervenção política e económica” do sexo feminino.

A vice-presidente da FEMM considera importante a aplicação de leis que contribuam para a igualdade entre homens e mulheres e salienta também que é necessário “mudar mentalidades”. Edite Estrela conta, por exemplo, que “muitos homens não gozam a licença de paternidade porque acham que vão ser gozados pelos colegas”. Por isso, pensa que devem haver “referências [masculinas] a nível nacional, nos diferentes sectores de actividade”, que assumam a partilha das tarefas domésticas.