Partindo de um conjunto de testemunhos sobre experiências de salvação e de um conto de Herberto Hélder, a coreógrafa Joana Providência dirigiu “Ladrões de Almas”, em palco a partir desta quarta-feira na Academia Contemporânea do Espectáculo (ACE)/Teatro do Bolhão, no Porto. O espectáculo de dança conta com cinco intérpretes (actores e bailarinos), que também participaram na concepção do trabalho.

Baseado no conto “Lugar, Lugares” de Herberto Hélder (do livro “Os Passos em Volta”), que já pairava na mente de Joana Providência “há uns dez anos”, “Ladrões de Almas” debruça-se sobre a humanidade e a salvação. “Um olhar sobre a terra”, diz a criadora, materializado em dois objectos: um filme e um espectáculo.

O filme tem o nome de “Árvores” e é da autoria de Eva Ângelo. Congrega testemunhos de várias pessoas “sobre terem salvado ou terem sido salvas ou terem querido salvar, sem terem conseguido”, explica Joana Providência. Aqui, o conceito de salvação é abrangente, pode ser “uma ideia, um gesto, mais pequeno, mais simples, como salvar um jantar.”

A salvação como “instinto”

“Árvores” inclui histórias como as de Madalena Vitorino, “que gosta de salvar objectos, como salvar um vestido antigo” e de Zé “Salva-Almas” Cedro, que recebeu a alcunha de “apanha-almas”, e depois a alterou para “salva-almas”, por ajudar as pessoas, no meio da tempestade ou do nevoeiro, que passavam perto do seu café, num lugar ermo.

O espectáculo foi concebido “como um objecto independente” do filme, baseado nas histórias retratadas por Eva Ângelo. Os intérpretes foram também co-criadores do trabalho de palco. “Contaram as suas próprias histórias”, disse Joana Providência ao JPN, e foi-lhes proposto que encontrassem forma de “dançar a história”. “Gostaríamos de partilhar a ideia de que salvar alguém ou algo é salvarmo-nos a nós próprios e que a salvação é ‘salvífica’”, lê-se no texto da companhia no programa do espectáculo.

Joana Providência questionou-se a ela própria sobre a salvação. “Lembro-me que no início achava sempre que tinha sido mais salva do que tinha salvado”, acrescenta. Depois lembra-se do dia em que a irmã caiu a uma piscina sem a bóia. “Instintivamente atirei-me e empurrei-a até à borda da piscina”, conta a coreógrafa. “As questões de salvar são um instinto”, acrescenta.

“Ladrões de Almas”, que estreou em Lisboa na sexta-feira, fica na ACE/Teatro do Bolhão até 27 de Abril, de quarta-feira a sábado, às 21h30, e no domingo às 16h.