A Câmara Municipal do Porto (CMP) tem levado a cabo uma política de concessões a privados de serviços (como a recolha de lixo) e infra-estruturas (como o Mercado do Bolhão e o Rivoli), que tem suscitado alguma polémica. Embora ainda não tenham sido efectivamente celebradas muitas das parcerias entre o sector público e o privado, estruturas como o Mercado do Bolhão e a Praça de Lisboa já foram concessionadas, com vista a serem reabilitadas e rentabilizadas.

As concessões representam “uma resposta aos problemas sem levantar encargos orçamentais”, afirma José Costa, economista e professor na Faculdade de Economia da Universidade do Porto. No Porto, as parcerias público-privadas (PPP) têm servido principalmente para reabilitar zonas e edifícios. José Costa reconhece que este tipo de parceria “pode evitar o endividamento” das autarquias, mas, “se a gestão não for bem feita, pode hipotecar o futuro”.

Dependendo das condições impostas, as concessões podem tornar-se desvantajosas a longo prazo. O economista dá o exemplo dos parques de estacionamento: “não se acautelam as tarifas [no contrato] e mais tarde chega-se à conclusão que a concessão é muito longa para serem praticadas tarifas tão altas”. No entanto, José Costa reconhece que, muitas vezes, cláusulas pouco vantajosas são necessájpnrias, para “diminuir o risco” de investimento e para cativar “pessoas com experiência e poder financeiro”.

“Hipoteca” do interesse público

Paulo Cunha e Silva, antigo director do Instituto das Artes, acredita nas vantagens da política concessionária, na medida em que “alivia a autarquia e dá aos privados território de intervenção”. “É um apelo à sociedade civil”, acrescenta. No entanto, Cunha e Silva reconhece que concessionar uma infra-estrutura não significa “fugir às responsabilidades”. A autarquia deve fiscalizar, sobretudo em concessões com valor sócio-cultural, diz o também professor da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, “para que o interesse público não seja hipotecado”.

Por outro lado, João Teixeira Lopes, sociólogo e dirigente do Bloco de Esquerda, não vê “vantagem absolutamente nenhuma” nas actuais concessões, que classifica de “abuso de poder”. “Estamos a hipotecar o passado, o presente e o futuro”, considera João Teixeira Lopes, face à duração das concessões até agora concertadas, como no caso do Mercado do Bolhão que foi concessionado à empresa holandesa TramCroNe por 50 anos.

Para o sociólogo, o argumento da rentabilização dos espaços como justificação para as parcerias público-privadas é “um absurdo”. “Alguns equipamentos não têm de dar lucro, têm de prestar serviço”, sublinha. O motivo é ainda menos credível, afirma Teixeira Lopes, num momento em que que “a câmara está com uma saúde financeira óptima”.

Rivoli convertido numa “monocultura”

Helena Santos, socióloga da área da cultura, considera o argumento financeiro “falacioso”. O teatro municipal Rivoli é, para a professora da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, um exemplo disso, já que consistiu em “entregar a uma empresa de produção cultural uma infra-estrutura numa situação que, para Filipe La Féria [dono da empresa] é muito vantajosa, porque o grosso da manutenção e das despesas continua a ser encargo do erário público”.

Recorde-se que o Rivoli não chegou a ser concessionado a Filipe La Féria, ficando o encenador como “convidado” do teatro. Contudo, no passado dia 28 de Fevereiro, o Tribunal Central Administrativo do Norte revogou a sentença que não permitia à CMP concessionar o Rivoli.

A questão do Rivoli representa, para Helena Santos, uma rentabilização ilegítima, porque implicou acabar com a diversidade dos espectáculos apresentados. “Não há espaço [no Rivoli] para a diversidade, não só em termos de teatro, mas de uma série de áreas que tinham ali espaço e desapareceram”. “É preciso que as outras coisas não tenham de desaparecer, porque senão como é que depois [a produção se] renova?”, questiona Helena Santos.

Paulo Cunha e Silva partilha da mesma opinião quanto ao Rivoli. “O que era um teatro municipal com produção versátil tornou-se numa monocultura”, diz. Além disso, o professor refere que o processo de parceria não foi realizado com responsabilidade, uma vez que a escolha da empresa já estava “predefinida” e não seguiu critérios como “a pluralidade programática”.