Assinala-se esta quinta-feira o Dia Internacional da Consciencialização para as Mucopolissacaridoses, um grupo de doenças metabólicas raras causadas por erros inatos do metabolismo.
As mucopolissacaridoses (MPSs) são um conjunto de doenças raras, de cariz genético, que fazem parte do grupo de doenças metabólicas causadas por alterações no funcionamento do lisossoma.
“São doenças hereditárias, que se caracterizam por deficiências em enzimas que actuam na degradação de macromoléculas que são compostas por grandes cadeias de açúcar” explica ao JPN Clara Sá Miranda, directora da Unidade de Biologia do Lisosoma e Peroxissoma, do Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC).
Essas enzimas que actuam num organelo celular chamado lisossoma “são responsáveis por digerir produtos que se tornam tóxicos para a célula e precisam de ser degradados”, diz a investigadora do IBMC. “Na falta dessas enzimas há uma acumulação de substâncias tóxicas que origina uma disfunção celular em células dos diferentes tecidos”, acrescenta.
As manifestações deste grupo de patologias caracterizam-se por deformações ósseas, atraso no crescimento, atraso psicomotor, alterações do comportamento, organomegalias que consistem no aumento do volume do fígado e baço, problemas de mobilidade, entre outras.
As formas mais graves destas doenças podem apresentar alterações ao nível do tórax causando problemas cardíacos e respiratórios. “Os doentes têm infecções recorrentes e muitas vezes morrem devido a problemas respiratórios graves”, afirma Clara Sá Miranda.
Na forma mais severa de algumas MPSs, a esperança de vida do doente pode não atingir os 10-20 anos de idade enquanto que “as formas menos severas podem levar a uma esperança de vida maior, mas com uma qualidade de vida sempre muito diminuída” como refere a investigadora.
Mucopolissacaridoses afectam 100 famílias em Portugal
Segundo Clara Sá Miranda, “em Portugal, nos últimos 20 anos, foram diagnosticados cerca de 100 doentes com uma de oito MPSs diferentes, o que corresponde a uma prevalência de 1 por 20 mil recém-nascidos”. Existem cerca de 100 famílias portuguesas afectadas por este grupo de patologias.
Estão descritos 11 tipos de mucopolissacaridoses, consoante a enzima deficiente, sendo que, em Portugal, os tipos mais frequentes são a doença de Hurler, a doença de Hunter e a doença de Maroteaux-Lamy.
Tratamento passa por “terapia enzimática de substituição”
Para os três dos 11 diferentes tipos já existe tratamento específico, a chamada “terapia enzimática de substituição” (TES), que consiste na administração aos doentes, por via endovenosa, das enzimas em falta, produzidas através de técnicas de recombinação genética.
“O tratamento é tanto mais eficaz quanto mais precocemente é iniciado em termos de idade” afirma a investigadora do IBMC, acrescentando que “a única coisa que o tratamento não corrige são as alterações a nível do sistema nervoso central porque a enzima não ultrapassa a barreira hemato-encefálica”.
Em relação às restantes MPSs existem apenas tratamentos de manutenção que visam melhorar a qualidade de vida dos doentes.
Doentes carecem de apoio do Serviço Nacional de Saúde
Na qualidade de presidente do conselho científico da Associação Portuguesa das Doenças do Lisossoma, Clara Sá Miranda alerta para a falta de apoio do Serviço Nacional de Saúde a estes doentes, para quem “em Portugal há uma demora excessiva em tratar os doentes depois de eles estarem diagnosticados”.
A responsável sublinha que “em relação aos doentes e suas famílias, para os quais não há terapia, nota-se um falta de apoio muito grande” que se traduz na falta de comparticipação de vários acessórios essenciais como fraldas, cadeiras eléctricas, camas especiais, falta de apoio psicossocial e integração dos doentes em escolas e/ou instituições de cuidados especiais.