O mutualismo apareceu em Portugal no séc. XIX, muito depois dos restantes países da Europa. O anarquismo teve a sua expansão nesta altura e, com a Primeira República, o mutualismo, associado a esta ideologia, expandiu-se, tendo sido criada em 1919 a Confederação Geral dos Trabalhadores, de tendência anarco-sindicalista.

Com a ditadura militar de 1926 os grupos anarquistas foram proibidos, tal como as associações mutualistas. Só depois do 25 de Abril foi possível um ressurgimento do movimento, embora com muito menor expressão. “Apesar da censura, que levou a uma quebra da dinâmica das associações mutualistas, a tendência agora é de voltarem a assumir o seu papel na sociedade portuguesa”, afirmou ao JPN Helena Moura, autora do livro “Solidariedade e Mutualismo”.

As associações mutualistas não têm fins lucrativos, apenas procuram obter proveitos que permitam reunir as condições financeiras necessárias para conceder aos seus associados os benefícios regulamentares. São instituições particulares de solidariedade social e de utilidade pública e regem-se pelo Código Mutualista, participando activamente na vida económica e social das cidades.

Em Portugal, existem cerca de mil associações deste tipo. A adesão é voluntária e exige apenas o pagamento de uma quota que vai para um fundo comum, que permite garantir o futuro da instituição e dos seus membros.

A União das Mutualidades Portuguesas é a maior associação mutualista em Portugal. Promove a representa o movimento no nosso país. Fomenta também a difusão do mutualismo num contexto de economia social, para além de definir as orientações estratégicas e as linhas gerais de direcção do movimento.

A relação com o Estado

O papel das mutualidades está consagrado constitucionalmente, cabendo ao Estado o apoio e a fiscalização das respectivas actividades com vista à prossecução dos seus objectivos de solidariedade social. De acordo com a professora Helena Moura, “o Estado e as associações mutualistas não têm tido uma boa relação”. “O Estado providência retirou um pouco as sinergias possíveis”, comentou.

João Freire, professor reformado do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), de Lisboa, explicou ao JPN que o Estado só se começou a interessar pelos problemas sociais em meados do século XX, quando criou os sistemas universais de segurança social”.

“Todavia, as associações mutualistas não foram discriminadas e o próprio Estado não criou obstáculos a que surgissem associações de socorros mútuos em vários corpos ou grupos do funcionalismo público, quando isso acontecia por iniciativa dos próprios”, acrescentou.

O professor esclareceu que, “do ponto de vista doutrinário, a relação entre as associações mutualistas e o Estado é de reconhecimento mútuo, mas de total independência das primeiras”. Contudo, embora se afirmem independentes, as associações de socorros mútuos esperam que o Estado as reconheça como entidades não lucrativas, solicitando redução ou mesmo isenção de impostos.

“Acredito que daqui para a frente vai existir uma parceria com o Estado para dar uma melhor resposta social. O Estado vai ter que criar parcerias, pois não tem capacidade para dar resposta a todos os problemas. A existência das associações mostra que há uma dinâmica e o Estado tem de aceitar e partilhar responsabilidades”, referiu Helena Moura.

João Freire afirma que hoje em dia “há uma reclamação por parte da sociedade de que ao Estado incumbem novas obrigações. Há a reclamação de que se ele não faz, que pelo menos apoie quem o faz”.