As primeiras sociedades de carácter mútuo ter-se-ão formado nos séculos V e VI, na Grécia Antiga, sendo de cariz religioso, económico ou político. Os recursos eram obtidos através das contribuições mensais dos associados e serviam para todos. Assim surgiu o mutualismo, um sistema de ajuda mútua entre os associados.

Desde sempre que houve uma preocupação por parte do ser humano em garantir o seu bem-estar através da ajuda entre todos. O mutualismo é, então, uma forma de economia social com objectivos não lucrativos.

João Freire, antigo professor de sociologia no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa, afirmou ao JPN que os objectivos das associações mutualistas “são a satisfação de necessidades primárias e sociais de toda a população”.

O professor reformado explicou que o mutualismo tem algumas das referências ideológicas do anarquismo, “do chamado socialismo utópico, que, a partir de 1830, começou a aparecer nos países que estavam a sofrer agudamente a chamada questão social, devido aos efeitos negativos da industrialização”. Isto fez com que as pessoas se deslocassem para a cidade, o que originou problemas de ordem social que tinham de ser resolvidos.

O anarquismo apareceu então como pensamento que se propunha resolver essas questões sociais, fazendo um “apelo directo às pessoas para se organizarem e resolverem os problemas colectivos e não estar à espera que seja um partido político ou o Estado a fazer isso”, esclareceu. Mas o mutualismo também foi influenciado pelo Cristianismo, sobretudo através do Protestantismo do Norte da Europa.

As associações mutualistas encontram os seus princípios na solidariedade entre todos, num apoio recíproco e voluntário entre todos os associados. Elas foram a base do sistema previdenciário em quase todo o mundo e Portugal não fugiu à excepção.

“Nos países católicos como Portugal e Espanha, o catolicismo social das misericórdias ganha um novo impulso no século XIX, com as associações de socorros mútuos constituídas em torno de figuras religiosas, de santos”, explicou João Freire.

Embora a maior parte das associações em Portugal fosse de ordem religiosa, apareceram, mais tarde, as influências socialistas num sentido muito amplo, ligadas aos grupos operários.

Tempos de crise no sector mutualista

Segundo João Freire, as instituições de economia social estão a passar por uma “fase bastante crítica”. “Veja-se o que aconteceu ao movimento cooperativo, as cooperativas de consumo praticamente desapareceram sob a difusão e a concorrência das grandes superfícies”.

“Do ponto de vista da eficácia económica essas formas tradicionais estão em grande dificuldade, embora surjam novas, protagonizadas por outras classes ou grupos sociais mais ricos”, comenta Freire.

O professor reformado do ISCTE refere que a maioria das associações de socorros mútuos existentes em Portugal são de pequena dimensão e não foram capazes de encontrar formas de fidelização para atrair os mais jovens. Mas há casos positivos: a maioria de associados da Benéfica e Previdente tem menos de 45 anos.

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa foi nacionalizada e é, por isso, menos afectada pela crise. A única instituição que conseguiu sobreviver e desenvolver-se sem ser nacionalizada foi o Montepio Geral, embora João Freire acredite que isso se deveu a algum tipo de ajuda dos poderes públicos.