Apesar de frequentemente ser convidada pela comunicação social para comentar casos de violência nas escolas a pedopsiquiatra Ana Vasconcelos critica a emissão de imagens violentas. A especialista aconselha os pais a mostrarem aos filhos que os podem ajudar a encontrar solução.
Que consequências traz para a discussão do tema a mediatização de casos como o da escola Carolina Micaelis?
A mediatização pode trazer vantagens que se encontram no facto de se trazer o tema para a discussão, mas não se pode mediatizar generalizando em casos que são específicos. Cada caso é um caso.
O tratamento dado pela comunicação é errado?
Situações como o da escola do Norte não deviam passar na televisão. Devia explicar-se o que os pais devem fazer quando eles querem levar o telemóvel para a escola, mas não é permitido. Devia haver diálogo construtivo que indicasse modos de agir.
Que riscos acarreta uma mediatização generalizada?
Não podemos tornar ficção, situações pontuais com características muito próprias, mesmo que elas estejam na ponta do icebergue, onde há muitas outras situações aparentemente idênticas. Criámos ideias erradas.
Como devem ser tratados os casos que chegam ao meio público?
Em pedopsiquiatria colocamos as palavras dos humanos nos actos que não percebemos para ver as intenções através da capacidade simbólica. Temos de perceber as intenções para entender o acto. As pessoas ficam-se pelas consequências e não pelos motivos.
O que podem os pais fazer para perceber melhor estas situações?
É preciso analisar os casos não como problemas humanos, mas como casos específicos. No caso da escola do Norte tratava-se de um problema relacionado com a moda das crianças usarem telemóvel e de se verificar uma perda de autoridade dos professores.
O bullying é um fenómeno dos nossos tempos?
O que acontece é que os miúdos entre dez e 11 anos podem espicaçar um colega que parece muito fraco, como se a fragilidade do colega pusesse a nu as suas fragilidades. Uma coisa é espicaçar, outra é violar a total capacidade de aguentar a violência dos outros. É o querer ser diferente.
Como podem os pais perceber que o filho é vítima de bullying?
Uma das características do bullying é a existência de chantagem. Em geral, a criança não conta logo no início, mas pode revelar aos pais ou ao irmão mais velho. A criança não quer ir à escola e pode apresentar sintomas físicos para os quais os médicos não encontram causa.
Como deve agir a família para solucionar o problema?
Depende dos recursos, mas primeiro deve falar com o médico que serve de referência à família (clínico geral ou pediatra). São normas do senso comum e do bom senso e, muitas vezes, a própria criança tem fragilidades que justificam um acompanhamento.
A solução passa pelo acompanhamento médico?
Não deve ser chapa zero. Os pais são competentes e sabem melhor do que ninguém o que fazer. A primeira coisa a fazer é aconselhar-se com o médico de referência. É essencial que nas situações em que a saúde mental está em causa não se “psiquiatrize” em demasia.
Pode causar o efeito oposto?
Dar-lhes logo uma pessoa com poder médico ou psicológico pode agravar as coisas. As atitudes que derivam da envolvência da pedopsiquiatria e psicologia não podem demitir os pais do seu papel, a parentificação. A criança tem de sentir uma afiliação normal, para que não veja os pais como incapazes.