A Mota-Engil apresentou, no passado dia 18 de Junho, o seu primeiro projecto imobiliário na zona oriental do Porto. O Ancoradouro-Condomínio Privado, que consiste em 98 apartamentos, será o primeiro projecto integrado na requalificação da zona ribeirinha a ser levado a cabo pela empresa e é bem-vindo pelos moradores de uma área do Porto que muitos dizem estar esquecida.

O presidente da Junta de Freguesia de Campanhã, José Fernando Amaral, considera positivo o investimento da empresa. “O sector privado como a Mota-Engil tem que fazer investimento para criar emprego, condições para que a cidade se renove em termos de habitação, já que o Porto tem vindo a ser desertificado”, revela.

No entanto, o autarca lamenta a falta de alguns equipamentos essenciais. “Falta um centro de saúde, uma esquadra para o bairro do Lagarteiro, um gimnodesportivo, creches, um centro de dia e um lar de idosos”, diz.

O pároco da freguesia, Fernando Leite, considera que estas carências e a precariedade de vida das pessoas da área se devem sobretudo ao desemprego. “Esta zona tem várias carências de habitação, alimentação e de educação porque os jovens abandonam a escola muito cedo. Como não há trabalho as pessoas estão muito tempo na rua ou à porta de casa, não tendo uma ocupação para a vida”, afirma.

A degradação oculta de um dos lados do Porto

Quem escolhe a saída traseira da estação de Campanhã pode deparar-se com este cenário de miséria, pobreza e degradação. Ruas esquecidas no tempo que escondem pequenas habitações, umas em cima das outras, sem que, por vezes, se compreenda quando acaba uma e termina outra.

A freguesia de Campanhã, localizada na zona oriental do Porto, está repleta de ruas estreitas decoradas com casas degradadas onde habitam famílias com poucas condições. A antiga fábrica de sabão, que no passado era fonte de rendimento e sinal de industrialização, hoje não passa de um monte de ruínas. O sabão deu lugar à sujidade e as únicas coisas que saem da antiga fábrica são ratos e insectos, que invadem, sem pedir licença, as casas ao lado.

Augusta Eugénia, 54 anos, viúva e desempregada, vive com duas netas, de 16 e três anos numa dessas casas. Há 18 anos a viver naquele local, paga 50 euros de renda, um quarto do rendimento mensal com que sobrevive, lutando para conseguir dar de comer às netas.

O telhado da casa já não desempenha a função de proteger da chuva, a humidade escorre pelas paredes sem tinta e as pedras da varanda vão caindo de dia para dia. Da casa – assim lhe tem que chamar Augusta Eugénia – fazem parte três divisões, um quarto, uma sala e uma cozinha “pequenina”, como a própria a descreve.

A ajuda da autarquia nunca chega e não é por falta de pedido. “Desde 2005 que meti o requerimento à câmara [do Porto] e nada”, revela. A solução apresentada pelos técnicos camarários, confrontados com a miséria em que vive esta família, resume-se a meia dúzia de traves de madeira colocadas como suporte da varanda do piso superior que ameaça ruir a qualquer momento.

“Eu só queria uma casa para sair daqui”

O medo de Augusta Eugénia é compreensível: parte da varanda já caiu para o seu pátio. “Por sorte, as pedras caíram durante a noite. Imagine que cai quando a minha neta está aqui a brincar”, diz. Os mais de 500 euros que já gastou para pôr portas e janelas mais seguras começam a ser pouco para aquilo que era preciso fazer para tornar a casa uma habitação digna desse nome.

Apesar da pobreza em que está mergulhada, Augusta ainda tem nos olhos a esperança de um dia vir a ter uma casa nova. “Eu só queria uma casa para sair daqui”, confessa.

Desempregados e trabalhadores precários procuram este tipo de casas onde a renda não passa os 250 euros. Sujeitam-se à miséria e à degradação porque não têm alternativa.