Filosofia “inovadora”
O presidente do Conselho de Administração da SRU não adianta muitos pormenores sobre que tipo de elementos e medidas poderão figurar no plano de gestão da zona classificada como património mundial. Adianta apenas que a filosofia de acção “é inovadora em Portugal”, visto que integra várias vertentes, do urbanismo aos problemas sociais. Trata-se de “resolver problemas da área urbana”, do “dia-a-dia” da zona histórica, diz.
Expectativa e optimismo, mais ou menos moderado. É desta forma que dois membros do movimento Cidadãos do Porto – Sociedade Aberta, que no ano passado assinalou o 11º aniversário da classificação do centro histórico portuense como património mundial pela UNESCO, olham para a intervenção prevista para aquela zona, apresentada no final de Junho pela Porto Vivo – Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU).
A SRU apresentou um estudo de desenvolvimento estratégico para a zona. A Porto Vivo quer fazer dela “parte integrante da cidade, pensando-a como um lugar para habitar e trabalhar, lugar de consumo e produção e como lugar de lazer e recreio”. Além de vários projectos (como a rodagem de um documentário sobre a reabilitação do Morro da Sé), está prevista a preparação de um Plano de Gestão do Porto Património Mundial, que deverá estar pronto até fins de 2008 (uma imposição da UNESCO).
A filosofia geral do projecto passa por estimular o diálogo e a cooperação das várias entidades que trabalham no terreno, da Câmara do Porto às associações de apoio social, com o objectivo de recuperar o centro histórico e aproveitar o título da UNESCO.
Ao JPN, o presidente do Conselho de Administração da Porto Vivo, Arlindo Cunha, afirmou que poderá ser a própria SRU a funcionar como elemento articulante. “Possivelmente [será], mas nesta altura ainda não posso avançar mais nada”, disse.
Entre a cautela e o optimismo
“Há muito tempo que devia haver um serviço que se ocupasse do centro histórico, que fizesse essa coordenação. A tónica foi sempre a da recuperação urbanística”, diz Licínia Rangel, membro do movimento e chefe da Divisão de Turismo da Câmara do Porto de 1993 a 1998, actualmente a fazer uma tese de mestrado sobre o centro histórico.
Francisco Rocha Antunes, promotor imobiliário e outro dos 11 membros fundadores do Cidadãos do Porto, SA, diz que este “é um primeiro passo”, com o “enorme mérito de ser um programa partilhado, que ouviu muitas pessoas, um processo correcto, mas invulgar”. Se a “bondade e pertinência” são evidentes, Francisco Rocha Antunes tem “algumas dúvidas”: “o sucesso depende em parte dos serviços camarários”, de segurança e limpeza urbana, por exemplo, que, apesar dos anúncios de reforço, “não se sentem ao nível” que se ambiciona.
Menos optimista, Licínia Rangel lembra que já houve outras tentativas de articular instituições, como a Associação Porto Histórico, que não conseguiram tirar partido do título Património Mundial. “A Câmara acaba por se sobrepor às outras entidades”, refere, quando questionada sobre o falhanço dessa associação.
Divergências quanto à liderança do processo
Quanto ao projecto da SRU, Licínia Rangel diz que, devido à sua vocação imobiliária, a “Porto Vivo não tem a superioridade moral” que, por exemplo, uma entidade como a Associação Comercial do Porto poderia ter para articular reabilitação urbanística com integração social.
Por isso, a membro do movimento de cidadãos limita-se a “estar na expectativa”. “Até agora o que tem sido feito são medidas avulsas, muitas delas para responder à opinião pública e para camuflar os buracos de uma política que não tem sido culturalmente estruturada. A perspectiva dele [do presidente da Câmara, Rui Rio] é sempre a do parque temático”, acusa, citando as corridas de aviões sobre o Rio Douro.
Já Francisco Rocha Antunes diz que a SRU tem a vantagem de ser uma estrutura com participação camarária e estatal, o que lhe dá uma forte “capacidade de mobilizar”. “É um problema do Porto: passamos mais tempo a discutir as pessoas que fazem as coisas do que as coisas”, diz, em reacção aos receios de Licínia Rangel.
Dos vários projectos previstos para o centro histórico, Francisco Rocha Antunes destaca a transformação do centro histórico num espaço de aprendizagem para grupos de estudantes e as sessões de formação turística para agentes locais. “Hoje é evidente que é o turismo que está a dar o principal contributo para a reabilitação da Baixa”, exemplifica.