Foi professor nos EUA e na Universidade do Porto. Ajudou-o na criatividade, na procura de novos personagens e novas situações?

Tudo o que o escritor faz pode entrar na sua escrita. Desse ponto de vista, o contacto que eu tive com os jovens foi uma ajuda porque eu não tenho filhos e se não tivesse ensinado durante 16 anos teria perdido o contacto com pessoas mais jovens. Também era uma grande ajuda porque era o meu contacto principal com a sociedade portuguesa.

Um escritor pode passar oito, 10, 12 anos em casa, todos os dias, isolado, sozinho. Teria sido fácil perder o contacto com outras pessoas e com a cultura portuguesa. As minhas aulas obrigavam-me a continuar a manter um contacto, físico até, com outras pessoas, que foi uma grande ajuda.

Gostava de voltar a dar aulas?

Todas as semanas não. Dei aulas 16 anos, gostei muito, sobretudo do contacto com os alunos, conheci jovens fantásticos, foi uma experiência muito gira dar o meu contributo para uma nova geração de jornalistas. Orgulho-me desse compromisso, por mais pequeno que seja.

Posso imaginar-me a dar workshops de escrita criativa, por exemplo, ou crítica a livros. Gosto de fazer isso. O ano passado fiz uma comunidade de leitores na Biblioteca Almeida Garrett. Adorei, o contacto com os leitores foi fantástico, tinham ideias completamente diferentes das minhas sobre os romances que íamos lendo.

E de voltar a praticar jornalismo, gostava?

De vez em quando, quando alguém me pede, escrevo. O Ricardo Pais, do Teatro Nacional São João, pediu-me para escrever um texto [PDF, página 25] sobre “O Mercador de Veneza”. Gostei dessa experiência.

Que escritor português gostaria de entrevistar?

Eça de Queirós, porque era clarividente. Ao descrever a sociedade portuguesa do século XIX, estava quase a descrever a do século XXI. Evidentemente que há diferenças, mas certas características do país e da gente permanecem. Seria interessante falar com ele, se ele pudesse vir para 2008, falar do século XIX, falar de 2008, o que, na opinião dele, mudou e o que não mudou.

E americano? Que escritor gostaria de entrevistar?

É uma boa pergunta… Tantos… Gostaria de entrevistar um escritor americano que nasceu na Polónia, penso eu, que é Isaac Bashevis Singer. Emigrou para os Estados Unidos nos anos 20, escrevia como uma ponte entre duas culturas: a cultura judaica da Europa e a cultura norte-americana. Seria interessante colocar-lhe uma série de perguntas sobre o seu percurso pessoal e a cultura judaica e os Estados Unidos, como é que mistura as duas.

O que é que pensa dos blogues, do crescimento dos media na Internet, de fenómenos como o jornalismo do cidadão? São uma mais-valia nas oportunidades ou apenas “muito do mesmo”?

(risos) Os dois. A Internet é uma das grandes esperanças para nós que queremos informações muito variadas sobre os assuntos mais variados. É óptima para conseguir informações sobre o que realmente se está a passar no Afeganistão ou Iraque. Se recorrermos aos jornais mais populares vamos ter um leque de informação muito reduzido. Podemos conseguir mais informações, e possivelmente mais precisas e realistas, através de blogues, revistas na Net…

Por outro lado, [a Internet] está sobrecarregada de blogues, informações pessoais. Hoje em dia, qualquer pessoa com um computador pensa que tem alguma coisa a partilhar com o público e escreve sobre o dia-a-dia, os familiares, o cão, tudo! É uma ferramenta perigosa, porque pode estimular pessoas que têm muito pouco a dizer, que não são interessantes ou informadas, a escrever sobre tudo.