São 20h00. Os voluntários encontram-se em frente à Praça Velásquez e esperam que toda a gente chegue para começarem a ronda. Depois de toda a gente estar presente, seguem para uma residência da Legião da Boa Vontade (LBV) e começam a preparar os kits (com iogurtes, frutas e pão), a sopa, o leite, os cobertores e a separar roupa por géneros.

Este trabalho demora cerca de duas horas. Só depois de tudo estar devidamente arrumado nas carrinhas é que os voluntários estão prontos a começar. Na noite em que o JPN acompanhou a LBV, a Ronda da Caridade contou com a presença de crianças e adolescentes de uma Aldeia SOS. “É uma maneira de estas crianças se aperceberem que há pessoas que vivem em condições muito piores do que eles”, explica Joaquim Sousa.

Este voluntário é o chefe da ronda, que ajuda cerca de 100 pessoas no Porto, e já faz parte desta instituição há quatro anos. Já trabalhou com várias organizações de solidariedade. O voluntariado é, para ele, uma experiência muito recompensadora: “enquanto cidadãos temos o dever de ajudar”.

Apesar da ronda nunca ter uma hora certa para acabar, o seu horário tardio foi uma das razões que fez com que Ana Correia quisesse ser voluntária da LBV, pois tem de conciliar o seu trabalho com o voluntariado.

Desde que a ronda começa que se vê que há uma familiarização ente os voluntários e certos sem-abrigo. Ana Correia ressalva isso como um aspecto positivo, que é o dos sem-abrigo reconhecerem o seu trabalho e de ver que algumas pessoas ficam agradecidas e dizem “obrigado”.

Contudo, conta que “há pessoas que estão muito chateadas, que estão muito revoltadas com a vida” e mesmo que essas pessoas recusem a ajuda os voluntários não podem ficar ofendidos”. “Não foram eles que pediram ajuda, nós estamos aqui porque queremos”, explica a voluntária.

Voluntários amigos

Alguns sem-abrigo também consideram os voluntários como seus amigos. Entre eles está “João”, nome fictício, que já é auxiliado pela LBV há 18 anos.

“João” revela uma relação próxima de Joaquim Sousa, que o descreve como uma pessoa por quem tem “muito respeito”. “É um contador de histórias”, diz o voluntário.

“João” viveu um tempo em Espanha e lá também foi auxiliado por uma instituição de caridade, exceptuando que no país vizinho a ajuda era disponibilizada diariamente. Ambos os voluntários falam nessa necessidade de haver um entendimento entre as várias instituições, pois “as pessoas não comem só à sexta e ao sábado, também precisam de comer durante a semana”, refere Ana Correia.

Joaquim Sousa diz ainda que não há falta de voluntários na Legião. O que é preciso é “mais pessoas, ou mais entidades” que ajudem, “mais donativos para fazer a ronda” e alimentos.

Ana Correia também acha que existem voluntários suficientes, isto também porque “as pessoas têm cada vez mais consciência para este fenómeno que é cada vez maior em Portugal. Não é preciso vir à noite, basta vir de dia à Baixa do Porto para ver que as coisas estão cada vez pior. Não sei se há alguma estatística em relação a isto, mas tem sido assustador, durante o dia a toda a hora do dia há pessoas na rua a dormir encostadas, o que durante muitos anos não se via”.

Desde as Antas, passando pela Areosa, pelo Aleixo, pela Baixa, e voltando ao sítio onde a ronda começou, a madrugada de sábado chega ao fim e a missão foi cumprida. É tempo de os voluntários voltarem para casa.