Várias associações LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros) revelaram ao JPN não estar surpreendidas com a posição da Igreja Portuguesa que, ontem, admitiu apelar ao voto contra partidos que defendam a legalização do casamento homossexual.

Na terça-feira, após reunião do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), em Fátima, o porta -voz da instituição, padre Manuel Morujão, marcou o tom, em jeito de aviso: “Os cristãos, seguramente, tomarão as suas conclusões, porque não é fiável quem se mete por estas aventuras, em que a sociedade fica exposta a feridas, que são profundas”.

António Serzedelo, presidente da Opus Gay, confessa-se “pouco espantado”, pois as afirmações “vêm na linha de tradição da Igreja Portuguesa e do Vaticano”. Sérgio Vitorino, da associação Panteras Rosa, acentua: “Nós conhecemos as opiniões medievais da Igreja sobre a sociedade”.

“Não surpreendem, mas não deixam de ser chocantes”, diz Rita Paulos, porta-voz da Rede Ex Aequo, para quem é “incoerente” que uma instituição que defende o “amor pelo próximo” não reconheça a diversidade familiar. “A família ideal, a ideológica, é uma coisa que já não existe”, salienta Sérgio Vitorino.

Confunde-se “sacramento” com “negócio jurídico”

Para o presidente da associação ILGA Portugal, Paulo Côrte-Real, o “fundamental” é separar dois conceitos: o de casamento civil e o de casamento religioso. “E o casamento civil é, por definição, inclusivo, logo tem de ser respeitado”.

“A Igreja faz essa grande confusão. Confunde o sacramento com o casamento negócio jurídico”, sublinha Serzedelo, que, olhando para o passado, desvaloriza um possível apelo ao voto contra os partidos que apoiem o casamento entre homossexuais. “Na altura do referendo ao aborto afectou em sentido contrário”, diz, recordando o envolvimento da Igreja Católica na questão.

“Não é correcto estar a dizer às pessoas para mudar o voto simplesmente por causa disto”, afirma Rita Paulos, sublinhando que “os crentes têm discernimento próprio”.

“É uma ameaça que, eventualmente, pode até ser contraproducente porque é difícil defender, de forma racional, a exclusão, e a hierarquia da Igreja não significa a posição de todos os católicos”, salienta Paulo Côrte-Real. Até porque, diz Sérgio Vitorino, “há muitos católicos homossexuais e, por isso, a Igreja tem de aprender a reconhecer a diversidade no seu próprio meio”.

Igreja marca posição

Ainda sobre o casamento homossexual, a CEP prometeu divulgar, dentro de duas semanas, uma nota pastoral sobre a matéria, mas Manuel Morujão avançou que existem “outras prioridades”, como a “crise”, com que os políticos se deveriam ocupar “dando os apoios de que as famílias precisam para responder aos desafios actuais”.

“As organizações da Igreja movimentar-se-ão, não contra alguém, mas em favor de uma causa”, concluiu.