O ar sereno e a calma glaciar de Wim Wenders são o aperitivo para o humor corrosivo com que brinda a audiência – presente, em peso, no Pequeno Auditório do Rivoli – na apresentação do seu mais recente filme, “Palermo Shooting”, exibido sexta-feira no “Fantas”, mas com estreia nacional prevista para 5 de Março.

A história conta-se em poucas palavras. O realizador queria fazer um filme sobre algo que o afectasse particularmente. Concluiu que, actualmente, a falta de tempo era a coisa mais importante da sua vida.

“Sofro da doença de não ter tempo suficiente, nem para mim, nem para os outros. Por isso, fiz um filme sobre um fotógrafo. Porque os fotógrafos sofrem desta doença mais do que qualquer pessoa, já que trabalham com ferramentas que apagam o tempo”, explicou Wenders.

A criatividade de Paul Schrader

Paul Schrader, argumentista de “Taxi Driver”, também marca presença na 29.ª edição do Fantasporto. O seu mais recente filme, “Adam Ressurrected”, encerrou o festival no sábado. Neste projecto, o realizador americano revisita a mente de um judeu da Alemanha nazi, internado num hospital psiquiátrica graças aos horrores que viveu nos campos de concentração. Em conferência de imprensa, na sexta-feira, o realizador confessou que a maior dificuldade com que se depara hoje em dia é tentar criar uma “história original”, numa altura em que a maioria dos filmes são “aborrecidos”.

Por isso, realizou “Palermo Shooting”, uma história sobre um fotógrafo ou antes uma metáfora sobre a vida. A escolha desta cidade italiana para local de rodagem não foi inocente. “Palermo tem uma atitude extraordinária em relação à morte”, justifica o realizador.

A morte afirma-se como uma personagem no desenrolar da acção, algo que, para Wim Wenders, é muito raro na história do cinema. “Deve ser, de alguma maneira, um tabu. Não é suposto falarmos sobre a morte. É suposto matarmos pessoas nos filmes, mas não reflectir sobre a morte”.

Falar sobre a morte foi a forma que o realizador encontrou para reflectir sobre a vida. “Não é divertido pensar sobre a morte. Mas percebi que todos nós temos, uma vez na vida, um momento privilegiado para observar a nossa vida: quando morremos”.

No sábado, Wim Wenders e o realizador americano Paul Schrader (ver caixa) foram distinguidos com o Prémio Carreira na sessão de encerramento do Fantasporto.