É um meio relativamente pequeno, composto por entusiastas com os mais diversos gostos. Reúnem-se em lojas e alfarrabistas e, em comum, partilham o gosto por aquela que é conhecida como a “nona arte”. Dos conhecidos super-heróis à mais obscura narrativa indie comic, a banda desenhada (BD) reúne as mais diversas obras, que são muitas vezes difíceis de encontras nas bancas.

No Porto existem duas lojas dedicadas ao género: a Mundo Fantasma, no Centro Comercial Brasília desde 1996, e a Central Comics, na Rua do Bonjardim, no activo desde 2006. Ambas optam por uma selecção ecléctica, com uma aposta forte nas importações de comics americanas e de manga japonês.

É um género que teima em agradar às mais variadas faixas etárias, como explica o responsável pela Central Comics, Hugo Jesus: “Temos clientes de todas as idades, desde pessoas mais velhas que compram a BD europeia e portuguesa, passando pelo pessoal com vinte e poucos anos que compra comics americanos e depois o pessoal abaixo dessa idade que compra manga.”

Vasco Carmo, sub-gerente da Mundo Fantasma, concorda, mas consegue traçar um perfil-tipo. “Jovens com 25, 26 anos, na universidade ou com uma profissão liberal, de bom nível académico e cultural”, conclui.

Mas nem tudo é positivo. Vasco Carmo queixa-se da “falta de atenção por parte dos editores”. O sub-gerente da Mundo Fantasma recorda as décadas de 70 e 80, anos prolíficos em BD, graças as actividades de várias editoras portuguesas, que depois foram desaparecendo. Com isto, muitas lojas começaram a apostar no mercado das importações. Outras, seguiram outro caminho. “Muita gente acabou por desistir”, lamenta Vasco Carmo.

“Um cérebro um pouco desviado”

O que leva uma pessoa a prosseguir o hábito da BD em adulto? “Há banda desenhada para crianças, adultos e existe inclusivamente banda desenhada que as crianças não deviam ler.” explica Diogo Resende, estudante de design na Escola Superior de Artes e Design (ESAD) e membro da equipa AnimePortugal, um fórum com mais de doze mil utilizadores. Paulo Fraga, técnico de audiovisuais, sublinha a qualidade da arte e as narrativas, “principalmente quando começam a pegar mais na parte política”. Hugo Jesus remata com “uma teoria”: “Eu acho que os fãs de banda desenhada têm um cérebro um pouco…desviado, por assim dizer. Se és mesmo fã estás interessado desde o início, nunca paras de gostar”.

A este fenómeno soma-se “a falta de hábitos de leitura”, que também afecta a banda desenhada, um “sub-produto da literatura”, sublinha Vasco Carmo. “Mesmo dentro desse meio acaba por ser considerada uma arte menor, e, [além disso], em Portugal existem poucos hábitos de leitura e há pouca cultura geral”, acrescenta.

O gosto pela colecção

Para os entusiastas de banda desenhada antiga, existem alguns alfarrabistas especializados. Em plena Rua da Conceição encontra-se a Tintim Por Tintim. Aberta em 2003 pelo ex-director financeiro Alberto Gonçalves, a loja vende sobretudo volumes de banda desenhada franco-belga, americana e brasileira, publicados antes da década de 90. Também se podem encontrar antigas revistas de humor portuguesas, brinquedos e livros de cordel.

Alberto Gonçalves afirma que a clientela é bastante variada, mas o principal público são os coleccionadores.”As pessoas compram mais banda desenhada para completar uma colecção, do que por paixão pelas histórias”, afirma. O número de clientes estrangeiros é também considerável. “Já vendi banda desenhada portuguesa a coleccionadores australianos, holandeses e flamengos”.

A poucos passos da Tintim por Tintim, abriu, recentemente, na Rua José Falcão, a Paraíso do Livro. Aqui pode-se encontrar BD de todos os géneros, inclusive alguns esboços e livros autografados por artistas de reconhecimento internacional. Inaugurada a 14 de Fevereiro, a loja é um projecto do professor de matemática Eduardo Neves, um veterano do coleccionismo. Sempre vendeu os excedentes da sua colecção de “quadradinhos” em feiras e chegou, mesmo, a ser sócio de Alberto Gonçalves noutra loja.

Só daqui a seis meses é que posso calcular o sucesso da loja”, diz Eduardo, salientando que “o número de clientes novos que aparecem tem sido razoável”. O responsável pela Paraíso do Livro traça um novo perfil de cliente: aquele que aposta em raridades como um investimento. “Em vez de depositarem o dinheiro no banco, investem-no em raridades, que nunca perdem valor, com bandas desenhadas originais do Rafael Bordalo Pinheiro do século XIX”.