JPN: O seu trabalho é direccionado para académicos. Tirando estudiosos, matemáticos e amadores interessados, acha que as pessoas gostam do trabalho de decomposição que faz? Estou a perguntar porque as pessoas tendem a ter receio de uma certa formulização das coisas.

ML: Compreendo, embora nunca tenha enfrentado esse medo de perto. As pessoas com quem eu lido diariamente são, na sua maioria, os denominados geeks e a maioria das conferências a que vou são geeks que facilmente se entusiasmam com este tipo de actividade. A tecnologia para esse tipo de pessoas é tudo menos um receio. Mas mesmo para as pessoas que tenham algum receio da transformação tecnológica da própria realidade será interessante verem que a representação visual de informação não está restrita ao pie-chart ou ao gráfico de barras, que se calhar é a representação visual à qual estão mais acostumados. E a segunda razão é que o “Visual Complexity” transmite essa percepção de um mundo altamente interligado e é um fenómeno que tenderá a crescer nos próximos anos. Várias áreas da ciência estão neste momento a tentar descodificar essa complexidade, percebendo que em nada existe uma fórmula modular e que tudo está interligado e de que forma essas interligações podem influenciar determinados processos ou sistemas.

Como é que se processa a análise de uma rede no “Visual Complexity”?

Primeiro é preciso os dados em bruto, ou seja, uma listagem de determinados elementos e como é que eles estão interligados. Pode ser uma básica folha de Excel, uma base de dados. Precisamos desses dados de antemão. Depois é criar um algoritmo, uma fórmula matemática, através de código e programação que crie determinados nós consoante a tabela original, em que cada nó seja criado para cada elemento e depois é estabelecer links de acordo com os dados que se possui. É muito simples, mas claro que existem processos mais complicados porque ao nível de algoritmos, da computação, principalmente os algoritmos que são mais complicados de modo a que o mínimo número de nós e de vértices, que são as linhas que unem os próprios nós, se sobreponham. Por isso existem inúmeros algoritmos que tentam simplificar ao máximo essa complexidade.

Fala em algoritmos, fórmulas, vértices… Há uma dimensão matemática muito forte no que faz?

Sim, sem sombra de dúvidas. Aliás, muito do processamento e visualização de dados não seria possível sem a análise de matemática que está por trás na produção de algoritmos que pretendem lidar com essa complexidade.

Considera que o seu trabalho só pode ser discutido em profundidade com matemática?

Não. Tenho todo o à vontade em discutir com designers, aliás é esse o meu background, tenho toda uma ligação afectiva com o mundo das artes. O que é interessante na visualização de redes complexas é que a discussão não está limitada a matemáticos, físicos ou cientistas de determinada área. O tipo de pessoas que surge no site é vastíssimo: desde artistas, designers, arquitectos, engenheiros, cientistas, matemáticos. Ou seja, com um grande espectro de actividades profissionais. E acho que não nos devemos cingir a um aspecto. Pessoalmente, acho que é um erro recorrente sobrevalorizar o aspecto estético. Não critico os projectos que fazem isto no âmbito das artes, têm todo o mérito, mas são coisas distintas. Essa confusão surge bastante frequentemente hoje em dia porque a visualização de informação é uma área nova e porque surgiu ao lado do que se chama arte generativa, ou seja, a criação de peças esteticamente agradáveis por meio de algoritmos que formam essa complexidade estética. Embora semelhantes, os objectivos e contexto são diferentes.

Como é que se define uma rede complexa hoje em dia? Qual é critério?

(Risos) Fazem-me essa pergunta frequentemente. É muito complicado porque a rede complexa, do ponto de vista técnico, é um elemento que pertence à física. Uma rede complexa é aquela que fica no limite do caos, mas não existe um número limite. Não podemos dizer que a partir de dois milhões de nós é uma rede complexa. Uma rede complexa tem alguns padrões de propagação que a tornam complexa a nível de como os nós crescem ao longo do tempo. Têm nós centrais que são enormes na sua capacidade de interligações e cumprem a regra do 80-20, ou seja, 20% dos nós têm a capacidade de interligação.

Voltando um pouco atrás, à conceptualização do seu trabalho, acha que o seu trabalho é um abstractização ou matematização do mundo?

(Risos) Não sei. Muitos dos projectos com que lidamos no “Visual Complexity” partem da necessidade humana que sempre existiu de representar visualmente o que nos é desconhecido. Uma coisa que assusta muita gente é a pergunta “o que é a internet?” e muitos dos projectos que surgem no “Visual Complexity” são tentativas de representação visual da própria internet, o que é algo que de certa maneira aconchega as pessoas. A partir do momento em que existe uma representação visual de um fenómeno como a internet, algo relativamente complexo, de certo modo serve para encarar o problema de uma maneira diferente. Muitos dos projectos indexados no site lidam com esse fenómeno, com a tentativa de visualizar mundos ainda desconhecidos.

Qual é a sua opinião sobre a dita web semântica, a web 3.0? Acha que isso se encaixa de alguma maneira no trabalho que faz hoje em dia?

Encaixa-se, encaixa-se bastante. Aliás, um dos maiores desafios que temos hoje em dia é extrair significado. O volume de informação que vamos enfrentar nos próximos anos é estrondoso. Acredito sinceramente que um dos grandes desafios deste século será lidar com o excesso de informação. Acumulamos informação de uma maneira estrondosa e não somos tão rápidos a fazer sentido dessa informação. É muito fácil para uma máquina interpretar essa informação em volume, ou seja, em escala de três MB, cinco GB, etc. O mais difícil é uma máquina extrair o significado dessa informação e é algo que muitas empresas têm debatido ultimamente. Vai ser um grande desafio implementar essa rede semântica. Muitos dos serviços tipo “delicious” e outros que nos permitem indexar a nossa informação exigem bastante tempo e dedicação para ordenar da maneira mais correcta. Um dos grandes desafios da rede semântica é tentar automatizar esse processo, minimizar o esforço humano, mas ao mesmo tempo oferecer resultados eficazes e satisfatórios.