A 25 de Abril de 1974, militares do Movimento das Forças Armadas (MFA) derrubam um regime ditatorial que se prolongara por quarenta e oito anos. Mas não foi só para Portugal que a “Revolução de Abril” trouxe mudanças.

Desde 1961, ano em que se registaram os primeiros movimentos independentistas face ao domínio português, as províncias ultramarinas de Portugal são palco de confrontos entre as guerrilhas e soldados. “Abril de 1974” marca o “início do fim” da Guerra Colonial e dá lugar aos processos de independência dos territórios africanos.

Trinta e cinco anos depois, os militares que combateram no Ultramar sentem-se “revoltados” com a situação a que foram votados. Manuel Nascimento, presidente da Associação de Ex-Combatentes do Ultramar, critica a actuação dos sucessivos governos portugueses. “O Estado não dignificou os homens que foram verdadeiros heróis na defesa da bandeira e do país”, refere ao JPN.

O dirigente e ex-combatente no Ultramar sente-se “defraudado por ver que os homens que deram tudo pela pátria portuguesa são esquecidos”. “Tenho pena de sentir que o Estado está à espera que o último homem se vá para nos homenagear devidamente”, confessa.

António Soares combateu durante dois anos na Guiné-Bissau. Com apenas 21 anos, o funcionário da EDP viu-se “obrigado a lutar por aquilo que não era nosso”. Em conversa com o JPN, António Soares diz que as lutas “não tinham lógica”, até porque a informação que recebiam “não era nenhuma”. Dirigente sindical há mais de quinze anos, o ex-combatente considera que existem situações “que nunca foram devidamente resolvidas”, como as de militares “acusados de revolucionários pelos patrões” ou que estão hoje em “situação de esmola”.

Duzentos ex-combatentes sem-abrigo

São cerca de duzentos os antigos militares sinalizados pela Associação de Combatentes do Ultramar Português (ACUP) como sem-abrigo. O Presidente da ACUP, Luís Nunes, realça a importância do “acolhimento destes homens” em vários centros espalhados por “várias zonas do país”. Ao JPN, Luís Nunes destaca os vinte e cinco militares sem-abrigo que estão em “processo de recuperação na Comunidade Vida e Paz”.

Para Manuel Nascimento, o facto de os antigos combatentes não terem sido “recebidos e tratados conforme se espera de um Estado de direito” potenciou a criação de situações de risco. “A guerra colonial transformou estes homens que deram tudo pela pátria em farrapos humanos, sem forças para reagir”, conta ao JPN.

“Uns homens estavam mais preparados que outros, e quando voltaram caíram em vícios, como o álcool. Foram abandonados pelas famílias e deixados sozinhos com os traumas”, conta o presidente da Associação de Ex-Combatentes do Ultramar. “Apesar de o sistema de apoio da Segurança Social ser complexo, estes homens precisam de protecção e de ajuda”, defende.

Desde Janeiro que os centros distritais do Instituto de Segurança Social têm indicação para facilitar o acolhimento de homens que lutaram além-mar e que hoje não têm tecto, em parceria com a Cruz Vermelha e a ACUP. Manuel Nascimento aplaude esta medida: “é gratificante saber que a Segurança Social e a Cruz Vermelha Portuguesa têm uma participação activa neste que é um dever do Estado”.