Enquanto o Movimento das Forças Armadas (MFA) tomava de assalto o Quartel do Carmo, em Lisboa, a cidade do Porto acordava, há precisamente 35 anos, para um dia marcado por confrontos entre a população e forças policiais e movimentações militares na Baixa. Só ao final da tarde chega a confirmação da queda do Estado Novo e, com ela, a perspectiva do fim da Guerra do Ultramar. O “dia seguinte” seria marcado pela libertação do último preso político no Porto e pelo início do processo revolucionário, distinto do que se viveu em Lisboa. Trinta e cinco anos depois, o JPN viaja também à contestação ao Antigo Regime vivida na academia do Porto, dá a conhecer a situação dos ex-combatentes do Ultramar e dá voz a um “Capitão de Abril” que fez a revolução na Invicta.

A 24 de Abril de 1974…

As movimentações conspirativas no Centro de Instrução e Condução Automóvel no Porto (CICAP), na rua D. Manuel II, denunciavam, já, a intenção de derrube do Estado Novo. O Capitão José Adelino Carneiro, juntamente com o Alferes Pêgo, distribuíra “as ordens de operações” para as unidades militares do Norte do país.

A tarde do dia 24 ficou marcada pela “espera”. “Sabíamos que se ouvíssemos o ‘E Depois do Adeus’ e a ‘Grândola Vila Morena’ era para executar o planeamento que estava feito”, conta o, hoje, coronel, ao JPN. Quando a rádio tocou a “Grândola”, uma companhia foi “tomar o Quartel General da Região Norte” e outro grupo foi “prender o Segundo Brigadeiro”. Ao jovem Capitão Carneiro coube a tarefa de “prender o Chefe de Estado Maior da Região Militar”, enquanto aguardava “notícias do que se passava em Lisboa”.

“Estas operações militares foram muito pacíficas, não houve resistência de nenhuma unidade militar que fosse favorável à ditadura”, esclarece o historiador Manuel Loff.

Ainda antes da chegada ao CICAP de uma Companhia de Operações Especiais vinda de Lamego, “o Rádio Clube Português [RCP] de Miramar cortou o sinal de antena, de maneira que ficámos sem saber notícias”, lembra José Adelino Carneiro.

A tomada da PIDE/DGS

Manuel Loff explica que a tomada da delegação da PIDE/DGS no Porto ocorreu “em circunstâncias muito mais controladas e de forma perfeitamente pacífica, ao contrário do que aconteceu em Lisboa”, onde se verificou a morte de civis. Só com o assalto das tropas do MFA à PIDE/DGS, já na tarde do dia 26, “se rende a última das estruturas que tinha apoiado a ditadura e que era um dos seus pilares fundamentais”, remata Loff.

Já na manhã de 25 de Abril, também as ligações telefónicas foram cortadas, o que dificultou ainda mais as comunicações com Lisboa. Mais tarde, o Capitão Carneiro foi mandado a “restabelecer os telefones”, à Rua de Ceuta. Em frente ao Hotel Infante de Sagres, o capitão deparou-se com “muita gente na rua a tentar saber o que se estava a passar” e com “uma carga da polícia a correr os manifestantes” da Avenida dos Aliados para a Rua de Ceuta.

À chegada dos militares, o povo “encheu-se de coragem e a carga que era da polícia contra as pessoas passou a ser das pessoas contra a polícia”, com pedras da calçada portuguesa, recorda em declarações ao JPN.

Após o restabelecimento das ligações telefónicas e da antena do RCP e a queda do governo em Lisboa, pelas sete da tarde, o “Capitão de Abril” deu uma “volta” pela cidade com várias companhias militares. Os soldados do MFA foram “aclamados” pela população enquanto os portuenses celebravam a liberdade. O 25 de Abril “chegara” ao Porto.