O Porto têm um novo ícone: Um origami branco, em forma de pássaro, é a mais recente intervenção artística nas paredes da zona histórica. Depois do “±” do graffiter Caos, da Mona Lisa em stencil, das bicicletas e do “cospe aqui” de artistas anónimos, as fachadas e ruas do centro do Porto são agora preenchidas por uma ave branca numerada.

Como é norma, os autores dos projectos desenvolvidos na rua receiam revelar-se, por receio de represálias leais. Por isso, gostam de de manter algum secretismo associado às suas iniciativas. Ainda assim, Ricardo Dias, de 29 anos, escultor, não deixa de reconhecer como seus os quase mil origami que têm vindo a colorir as ruas do Porto.

A ideia de colocar uma lata de tinta e uma caneta no bolso e vaguear pela cidade desenhando,
sobre um molde, o célebre origami japonês em forma de pássaro – o tsuru – nasceu “de uma
conversa sobre a simbologia do tsuro” e de uma “vontade” de se “pronunciar”, conta o artista ao JPN.

No Japão, “o tsuru é um pássaro que tem uma simbologia esotérica”, esclarece Ricardo. Reza a lenda que, ao fim de mil tsuru de origami feitos, o desejo que a pessoa pedir, realiza-se. “É um símbolo da felicidade eterna, da prosperidade e da longevidade”, razões que levaram o jovem a dar uma nova roupagem ao conceito. Começou a fazer desenhos em stencil pelas paredes do Porto, todos numerados, precisamente porque quer atingir a meta de mil origamis.

Quanto ao desejo pedido fica reservado aos segredos do jovem escultor. Desvenda, no entanto, que acredita “no poder da lenda” e que, se desenhou o primeiro tsuru no centro do Porto, onde vive há muito tempo, pretende pintar o derradeiro elemento da série – o número mil – numa das avenidas do Rio de Janeiro, onde nasceu.

O “spot ideal” para intervir

Para Ricardo, o trabalho na rua é “uma forma de expressão válida”, tal como uma pintura ou um desenho, só que ganha “uma dimensão expositiva”. “Passa a ser público”, diz, peremptório.

Se, à primeira vista, pode ser um “trabalho egocentrista”, depois “as pessoas podem retirar alguma conclusão, falar sobre ele”. “Vão-se questionar sobre quem o fez e por que é que o fez”, afirma, justificando a óptica da partilha da arte da rua.

Ainda assim lembra que a sua intervenção outside não têm uma “intenção política”. “O meu trabalho é poético. Não vincula uma ideologia reivindicativa ou reaccionária. É poético, é bonito, fala de uma lenda, a imagem é um pássaro… Onde é que ele intervém na sociedade?”, questiona. Mas a resposta vem célere:

“Intervém porque as pessoas questionam-se, dizem ‘este gajo é maluco [porque] meteu na cabeça que ia fazer mil pássaros’. Eu, aí, já estou a chocar a sociedade, há muitas pessoas que já falam do meu trabalho. Mas é sempre uma intervenção social”, justifica.

A técnica utilizada na execução dos tsurus brancos de contornos pretos “é umas das técnicas utilizadas no mundo do graffiter“. Mas, embora reconheça o grafitti como uma forma de expressão artística legítima, Ricardo Dias não gosta de ser catalogado como tal. “Eu nunca pintei na rua até agora. Não me identifico com o grafitti, identifico-me com a intervenção de rua, com a arte que se faz na rua”, distingue.