O convidado desta semana do ciclo “UP sob Investigação” trabalha, há cerca de dez anos, para fazer com que o momento do parto seja mais seguro. Através do projecto OmniView-SisPorto, desenvolvido juntamente com Diogo Ayres de Campos e em parceria com o Instituto Nacional de Engenharia Biomédica (INEB), o investigador da FMUP foi considerado entre os três melhores cientistas do mundo na área da cardiotocografia, área que analisa os batimentos cardíacos do feto durante o parto. Confiante nas “novas gerações”, que considera serem “sempre melhores que as anteriores”, João Bernardes acredita que a universidade deve assumir a forma de uma “comunidade de mestres e alunos” onde o conhecimento é transmitido.

JPN: Como é ser considerado um dos três melhores cientistas do mundo na área de estudo a que se dedica, a cardiotocografia?

JB: Não é um prémio no conceito de algo a que nos candidatamos; é uma posição que ocupamos numa base de dados e que envolve um milhão de cientistas em todo o mundo. Para nós isso é muito importante porque torna mais visível o nosso trabalho e é um termómetro da nossa própria posição no mundo científico. Para as pessoas novas que, juntamente com o meu colega Diogo Ayres de Campos, trabalharam fins-de-semana e, muitas vezes, sem bolsas, isto é uma grande motivação.

Como é que o Centro de Simulação Biomédica da FMUP, do qual é Director, contribui para o sucesso na medicina?

Aquilo que tem piada e que dá uma dimensão universitária a tudo isto é as coisas estarem todas interligadas. O Centro de Simulação (CS) surge muito à volta do trabalho que estamos a fazer. Nós, na equipa, não conseguimos distinguir onde começa uma coisa e acaba outra. A simulação já se fazia na faculdade e o CS surge em 2003 como um centro académico com as funções de investigação, de prestação de serviços e de ensino e, depois, com uma vocação grande para melhorar a prestação de cuidados médicos. Nós, este ano, pedimos apoio ao mecenato, e o nosso slogan diz tudo: “Humanizar, salvar e inovar”.

Perfil

Licenciado e Doutorado pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, João Bernardes especializou-se em Obstetrícia. Desde há vários anos ligado às tecnologias da saúde, o também Professor na FMUP é Director do Centro de Simulação Biomédica da FMUP e pertence, ainda, ao INEB. Recentemente, João Bernardes foi considerado um dos três melhores cientistas do mundo na área da cardiotocografia pela comunidade online BioMedExperts, graças ao projecto OmniView-SisPorto.

Fazer clínica ou entrar no bloco de partos ainda é o ponto alto do dia dia de um investigador e Professor como o João Bernardes?

Sim, sem dúvida. Todas estas actividades interessam-nos, essencialmente, porque pensamos que vão ser úteis para os doentes e para os não doentes. E aquilo que é interessante é que nós conseguimos fazer as pessoas que trabalham connosco e não são médicos sentir exactamente a mesma coisa. Eu acho que todas as pessoas que trabalham connosco, mesmo os técnicos do INEB, sentem que estão a tratar doentes.

A transmissão do conhecimento às gerações mais jovens é uma prioridade para o João Bernardes, enquanto Professor e Cientista?

Não é em vão que se tem investido em ciência em Portugal, os novos talentos são mesmo melhores que os anteriores e isso é que torna verdadeiramente interessante todo este processo multiplicativo. A geração que vem a seguir à minha já vem melhor que a minha. Aquilo que nós esperamos é que este tipo de processos não sejam interrompidos, pois começar de novo é recomeçar de um ponto mais básico. Aliás, pode-se notar precisamente pela avaliação bibliométrica: começamos numa primeira geração a publicar um ou dois artigos, a segunda geração já publica quatro ou cinco, e a terceira, seis ou oito. E isso é sinal de que os novos talentos têm valor.

Existe uma preocupação na divulgação do conhecimento que é gerado dentro da FMUP?

Há a preocupação de tentar crescer e de tentar passar esse crescimento através de um tratamento cuidadoso. É óbvio que há pessoas com mais vocação que outras para isso e que fazem um bom trabalho ao nível da divulgação. Existe a visão de que a ciência é fechada, e de que as pessoas que a fazem vivem fechadas em laboratórios. Mas eu considero que a divulgação do conhecimento científico é uma obrigação.

Quais os principais desafios que a Universidade do Porto enfrenta na actualidade?

Eu acho que o principal desafio é manter esta dinâmica de produção, com novas gerações e novas ideias. É importante que se recrie o espírito da Academia como uma comunidade de mestres e alunos, dinâmica e produtiva, para se atingir uma forma de imortalidade. As novas gerações têm que trabalhar muito e aproveitar o melhor de cada um, dentro da união e da diversidade. É necessário que se dominem as tecnologias num mundo tão competitivo. O segredo está em unir para aumentar a produtividade. As universidades não podem ser as torres de marfim incompreendidas pelas pessoas.