Vencedora do Prémio Gulbenkian Ciência 2009 no valor de 50 mil euros, Maria João Saraiva é coordenadora do grupo de Neurobiologia Básica e Clínica do Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e professora catedrática do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS). No seu trabalho tem vindo a seguir as pisadas do professor Corino de Andrade, o primeiro cientista a identificar a paramiloidose ou a “doença dos pezinhos”. Investigadora há mais de 30 anos, Maria João Saraiva considera que é “difícil” falar na cura da doença e que os laboratórios devem ser “pluridisciplinares” e não ter paredes.
Qual pode ser o impacto do Prémio Gulbenkian de Ciência no seu trabalho?
Para além do reconhecimento óbvio para mim e para a equipa de trabalho, é um incentivo nos nossos planos futuros para o estudo da doença [dos pezinhos]. E, obviamente, sob o ponto de vista monetário também vai ajudar.
É um prémio que distingue o seu trabalho de investigação na paramiloidose ou a “doença dos pezinhos” em específico?
É um prémio que analisou o currículo e as minhas contribuições para a ciência. Premiou uma carreira, um currículo, varias publicações… o percurso de uma pessoa, no fundo.
Em que ponto é que estamos na investigação desta doença?
Existem novas pistas de aplicação de novas drogas que estamos a testar e iremos testar outras drogas nos novos modelos. Vamos refinando cada vez mais e alargando o leque de possibilidades para o tratamento. Avançamos bastante nas ultimas décadas sobretudo com a explosão de metodologias da biologia molecular que dão possibilidades acrescidas na investigação. Mas ainda temos muito para perceber.
“É difícil falar de uma cura”
É possível falar em cura?
Temos vários laboratórios mundiais a trabalhar nesse sentido, mas é muito difícil falar de uma cura porque de repente pode aparecer um resultado que altera tudo. Nós agora temos e vislumbramos possibilidades mas pode aparecer um resultado que nos leve a investigar noutro sentido, noutra direcção.
Isso significa que ainda está longe?
É muito difícil dizer se é uma década.
Apesar de centrar as suas investigações na “doença dos pezinhos”, nunca chegou a trabalhar directamente com o professor Corino de Andrade, o primeiro cientista a identificar a doença.
Não cheguei a trabalhar com ele, mas discutia a ciência e os problema da doença com ele. Foi um privilégio tê-lo conhecido e durante muitos anos ter discutido com ele.
E por que razão optou por esta área específica de investigação?
Foi também as circunstâncias… [O facto de] ter conhecido o professor Corino nessa altura e ter-me entusiasmado com o trabalho.
Faz investigação em mais algum campo científico?
Também fazemos investigação na doença de Alzheimer porque a proteína com que lidamos, quando não é mutada nas suas condições fisiológicas normais, pode ser portadora da doença de Alzhemier e nos queremos perceber porquê…
Na sua opinião, qual é o panorama da investigação científica em Portugal?
Têm-se feito, ao longo dos anos, vários avanços. Mas precisamos de… É uma crise mundial em todos os casos e nos financiamentos também. Isso também se sente cá.
Faltam financiamentos?
Há a necessidade de abertura de mais financiamentos.
E estes prémios ajudam?
Claro, por isso é que pode ter algum impacto nessa área.
“Há muitos anos que se fala de laboratórios sem paredes”
E qual é o panorama da investigação na Universidade do Porto (UP)?
Pelas estatísticas que leio a UP está muito bem classificada em várias áreas. A minha área, em concreto, é uma pequeníssima área. De um modo geral, as estatísticas apontam para isso.
Qual o caminho que a UP deve seguir?
Deve sempre estar em colaboração com o estrangeiro porque hoje em dia é praticamente impossível fazer-se investigação sozinho. É sempre pluridisciplinar e deve estar em contacto com o estrangeiro. Alias, há muitos anos que se fala de laboratórios sem paredes. São várias equipas [num espaço] sem paredes. Isso é muito importante. E tentar ter pessoas cá, evidentemente.