O Porto futuro deve crescer como cresceu o Porto de hoje: por lotes e não por quarteirões; por pequenos proprietários – a cidade sempre foi da burguesia comercial – e não por grandes investidores. Esta é a opinião do arquitecto e docente universitário Nuno Grande, que, em Abril do ano passado, moderou algumas sessões do seminário Porto Redux.

Ao JPN, Nuno Grande afirma que a Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) Porto Vivo está a querer “esventrar os quarteirões do centro da cidade para fazer parques de estacionamento”. E garante que o que a cidade precisa é de fazer com que as pessoas “deixem de ser dependentes de carros, porque o Porto não aguenta ter tantos no centro”.

Mas aquilo que Grande considera ser a promoção da “cultura do automóvel” não é o único problema levantado às estratégias da Porto Vivo, que pretende reabilitar o Porto numa lógica de quarteirão.

“Estão a olhar para a cidade por quarteirões e a cidade não cresceu assim, cresceu lote por lote. E aquelas pessoas que querem trabalhar e viver no mesmo sítio e que se predispõem para recuperar apenas um prédio?”, indaga, criticando o conceito de “grande empreendimento de condomínio fechado” na Baixa.

“Para a Baixa vão as famílias atípicas, não as tradicionais”

Casais jovens, artistas, pessoas sozinhas ou famílias sem filhos – “aqueles que não precisam de grandes espaços para viver” – deveriam, segundo Nuno Grande, ser o “target” do projecto da Porto Vivo, o que, de momento, não acontece.

“A SRU tem de ir ao encontro das pessoas. O tipo de pessoas que vem para a Baixa morar não está a ser estudado nem pensado. O target da SRU continuam a ser as famílias típicas portuguesas, que têm muito mais espaço se forem para a periferia e essas não regressam. Quem quer vir para a Baixa são famílias atípicas”, diz, confiante de que as perspectivas das entidades responsáveis vão “mudar lentamente”.

Arrendamento sim, mas low cost

Uma das particularidades que Nuno Grande contesta no projecto da SRU é a lógica high cost. “A Porto Vivo publicita os grandes investimentos, com bons materiais, faz uma promoção imobiliária igual à de casas na Foz. Esta lógica é, para mim, até um pouco provinciana e, a meu ver, está a matar a cidade, porque o centro tem outras características. Se virmos outras cidades no mundo, é o modelo low-cost que prevaleceu”.

O arquitecto concorda com a ideia de privilegiar o arrendamento, tal como Francisco Rocha Antunes, mas apenas se for pensado “caso a caso, prédio a prédio, e não quarteirão a quarteirão”.

Admitindo que não se podem deixar escapar os grandes investidores, Nuno Grande lamenta a falta de incentivos ao “pequeno proprietário” e considera que é possível “acreditar” que o Centro Histórico do Porto voltará a estar habitado. “Mas a ingenuidade que houve no Porto 2001 foi achar que a cidade poderia ser reabilitada em três ou quatro anos. Isto é um trabalho de uma geração, de 20 ou 30 anos”, conclui.