Os exemplos de preconceito e discriminação são vários. As pessoas em Portugal ainda olham de lado os seropositivos. Esta é uma opinião partilhada por uma das assistentes sociais da Abraço, Ana Luísa Santos, que lida diariamente com esses casos, e pelo presidente da Associação Positivo, Amílcar Soares, que dá conta de “um medo básico [por parte dos portugueses] que alguma coisa aconteça.”
A SIDA transmite-se por via sexual, amamentação e partilha de seringas. Informação que muitos portugueses conhecem, de acordo com o estudo “A Opinião Portuguesa e a SIDA” do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica (ver caixa). Contudo, para Amílcar Soares esta é uma mentalidade “variável na sociedade portuguesa”.
“Quando souberam que eu tinha SIDA, recusaram servir-me num café porque tinham medo que os contaminasse”, revela “Belinda”, que já passou por várias situações de discriminação.
Estudo sobre a opinião dos portugueses sobre o VIH
O estudo “A Opinião Portuguesa e a Sida – Ultrapassar a Era do Medo”, dado a conhecer a 1 de Dezembro de 2008, resultou de inquéritos a 603 pessoas com idades compreendidas entre os 18 aos 65 anos e revela que a maioria dos portugueses inquiridos (93%) tem noção que os portadores de VIH positivo são discriminados. Metade da população acha “natural” que os portadores da doença tenham dificuldades em progredir na carreira profissional. Cerca de 42% dos inquiridos acha que um portador de VIH positivo não deve trabalhar em restaurantes; 33% afirma que “uma pessoa com SIDA não pode ser um profissional de saúde”. A seguir ao cancro, a SIDA é considerada pelos portugueses a doença mais grave.
Para acabar com a discriminação “era necessária uma mudança de mentalidades” que “ainda pode demorar algum tempo”, diz Ana Luísa Santos.
Amílcar Soares concorda e lança uma sugestão: “Era preciso que mais pessoas dessem a cara. Pessoas que têm alguma influência a nível social, tal como tem acontecido no caso do cancro que tem aparecido imensa gente a falar.”
SIDA associada a “valores morais pré-estabelecidos”
O presidente da Associação “Positivo” revela ainda que as pessoas associam a SIDA a valores morais pré-estabelecidos sobre a transmissão da doença.
“A ideia base é [que a SIDA é transmitida] por via sexual ou toxicodependência e isso, de alguma forma, joga com os valores morais das pessoas relativamente ao consumo de drogas e relativamente ao sexo. Se foram contaminadas [as pessoas pensam que] é porque foram muito promíscuas, muitos parceiros sexuais”, esclarece.
“Muitas vezes as pessoas esquecem-se que a SIDA é transversal à sociedade”, considera a assistente social da “Abraço”.
No ambiente de trabalho, por vezes, mesmo que os empregados sejam aceites pela sua condição, podem ser olhados de lado pelos colegas que ainda têm muito preconceito. Gera-se um “mau ambiente” de trabalho devido à discriminação.
“Belinda” optou por não revelar a sua condição porque ouvia os colegas a comentar que não queriam correr riscos. Quando estes descobriram a sua doença, foi chantageada. Acabou por contar à entidade empregadora. Mais tarde, teve de mudar de emprego.
Amílcar Soares revela ainda que há muitas coisas que se podem fazer a nível discriminatório, mesmo que não haja despedimento. “Há muitos relatos. É por isso que as pessoas cada vez mais escondem.” Ana Luísa realça que a “Abraço” tem, entre os seus utentes, vários tipos de pessoas, desde sem-abrigo e toxicodependentes a professores.