Em 1989, Katrin, alemã, nascida na parte leste de Berlim, tinha 15 anos quando assistiu à queda do Muro pela televisão. Recorda bem os tempos da República Democrática Alemã (RDA). Diz que na parte oriental do muro, e apesar do restrito regime socialista, não se vivia mal.

“Não se pagava a escola, não se pagavam propinas, nada”, conta. Todas as actividades extra-curriculares eram, também, gratuitas. Os pais não gastavam dinheiro na educação dos filhos.

“Ich war dabei” (“Eu estava lá”, em português) foi a iniciativa que reuniu, na quinta-feira, Katrin e outros alemães da ex-RDA na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Uma conversa integrada no programa de actividades organizado pelo Departamento de Estudos Germanísticos para assinalar os 20 anos da queda do Muro de Berlim.

Para Katrin, a RDA acabaria por perder com a reunificação. “Estivemos sempre numa posição muito inferior à das pessoas da RFA [República Federal da Alemanha] e mesmo hoje em dia sente-se muito este abismo económico”, conta, em declarações ao JPN.

“Vê-se tanta pobreza, sobretudo uma pobreza infantil, que cresceu depois da reunificação, que é mesmo incrível”, lamenta a alemã.

“Queríamos mudanças, mas as fronteiras não eram o alvo das acções”

Claudia Breitbart eram , em 89, uma jovem da RDA com ideais revolucionários. Recorda as manifestações que antecederam a queda do Muro de Berlim. Conta que o objectivo não era, nessa altura, a reunificação. “Queríamos mudanças, mas as fronteiras não eram o alvo das acções”, conta.

“As pessoas da RDA da minha geração eram completamente diferentes das da RFA. Comparávamo-nos com a Checoslováquia, por exemplo, e não tanto com a RFA”, continua a alemã.

O objectivo das manifestações passava por construir um Estado mais justo. “Queríamos que prevalecesse o que era bom da RDA, do sistema socialista, e mudar o que estava mal”, diz.

Claudia acredita que a queda do Muro de Berlim acabou por ser uma vingança dos políticos da ex-RDA. “Assim, destruíram também o que estava a formar-se”, lamenta. Apesar disto, considera que, no geral, a reunificação foi positiva.

Entre a queda e a reunificação, a RDA foi-se democratizando. “As pessoas tinham menos medo de falar”, recorda Claudia. “Mesmo antes da reunificação politica, entrou a moeda do outro lado e isso mudou tudo radicalmente”, conta, explicando que todos os produtos do oriente desapareceram de um dia para o outro.

Alemanha reunificada, mas a duas velocidades

O jornalista do Público Luís Miguel Queirós não assistiu à queda do Muro, mas esteve em Berlim no ano seguinte. Conta que a diferença entre as duas partes de Berlim era assinalável. Fala numa Berlim Oriental muito cinzenta, comparativamente a Berlim Ocidental, que descreve como uma cidade “fervilhante”.

“[O lado oriental] era mal iluminado, com um ar um bocado sinistro. Não havia restaurantes, os que havia pareciam cantinas”, descreve.

“A ideia que eu tenho é que quando estive lá da primeira vez só se viam algumas mudanças no centro de Berlim, mas saía-se daquilo, andava-se mais uns quilómetros e encontrava-se a RDA tal qual existia antes”, recorda.

“O que me diz quem vai lá agora é que já é difícil perceber-se onde é que esteve o Muro”, conta, fazendo alusão a relatos de alguns amigos que visitaram a Alemanha recentemente.