Joana Providência vive para a dança. Aliás, a bailarina, coreógrafa, encenadora e professora, nunca considerou seguir outra profissão e no seu dia-a-dia não existe espaço para qualquer outra actividade. Quando questionada acerca do que faz sempre que não está a dançar, responde sem hesitar: “durmo e ando de bicicleta.”
No ano em que completa duas décadas de carreira, Joana Providência olha o futuro e imagina-se “muito velhinha, já muito perra, de bengala, mas ainda a espernear por todo o lado” e diz que viver sem a dança seria como estar amputada. É assim, diz, desde os sete anos, quando deu o seu “primeiro passo de dança”.
O início, no entanto, não foi fácil. Sair de Braga e perseguir o que era um sonho, foi um processo solitário, refere, no qual os pais foram, por vezes, um entrave. Aos 17 anos, e quando já dava aulas de ballet, Joana Providência decidiu sair de Braga e ir viver para o Porto, enquanto esperava pelo aguardado curso na Escola Superior de Dança, em Lisboa. A experiência de viver em Lisboa, numa altura em que o resto do país estava ainda fechado a muita da arte que se fazia no estrangeiro, foi determinante para a formação da coreógrafa e bailarina. Até porque defende que “é importante fazer um esforço para abrir o leque de informação” a outras áreas da arte. “Há imensas pontes que se consegue estabelecer na pintura, na escultura ou na performance e que são essenciais”, esclarece.
Contudo, Joana Providência volta, mais tarde, ao Porto para aí sediar a sua carreira e contribuir para a criação da Academia Contemporânea do Espectáculo, onde é professora. Embora considere que em Lisboa continua a ser mais fácil estar perto de um certo esquema profissional, e de que não fazer parte desse sistema pode ser negativo, não se arrepende de ter voltado ao Porto. “Neste momento sinto que sou uma pessoa que de facto pertence ao Porto, sinto que estou próxima das pessoas do teatro. E acho que pertenço a uma geração de pessoas e de companhias que se calhar têm um trabalho que não é o meu, mas de que me sinto parte”, justifica.
“Estou onde devia estar”
Nos espectáculos que cria, e com os quais realizou uma digressão nacional a propósito das comemorações dos 20 anos de carreira, gosta de “provocar o público e de o despertar”. Acredita que todos os corpos contam uma história, mas admite não ser uma boa contadora de histórias. Por isso mesmo dá liberdade aos seus intérpretes, a quem pede que desempenhem essa função. Confessa que o seu papel, enquanto criadora e encenadora é o de “roubar as coisas aos intérpretes e encontrar um caminho para o que eles vão fazendo”. Acrescenta que as suas próprias memórias poderão não estar presentes nas suas criações, mas “as dos intérpretes sim, essas estão lá”.
Se fosse ministra da Cultura por um dia, diz Joana Providência, criaria uma rede de ligação entre todas as salas de espectáculo do país e um sistema de subsídios que obrigasse as companhias contempladas a percorrer todos esses espaços culturais. Dessa forma, acredita que seria possível combater a falha na programação anual de muitas salas, que não recebem espectáculos de dança ou de música.
No entanto, sente-se feliz com a profissão que tem e com a vida. “Eu sinto que hoje em dia há muita gente que tem um trabalho de que não gosta e eu tenho um trabalho de que gosto muito, que é dar aulas de dança. Acho que uma pessoa fazer aquilo de que gosta é meio caminho andado para a felicidade”.
Vinte anos depois de ter saído de Braga, Joana Providência sabe que fez a escolha certa. A única que poderia ter feito. Os pais, sem lho dizerem directamente, concordam e não falham os seus espectáculos. “Eles nunca me disseram, mas hoje em dia percebem que eu estou onde devia estar”.