A guerra colonial deixou marcas profundas em quem lutou nas ex-colónias portuguesas. Doenças causadas pelo stress de guerra atormentam a vida de muitos ex-combatentes do Ultramar.

Muitos encontraram na droga um refúgio. Francisco Martins é um desses casos. Do tempo passado além-mar, recorda que se perdeu na cannabis. “Andava meio perdido por causa da ervinha, a tal liamba. Hoje chamam-lhe cannabis“, conta. Apesar de ter feito diversos tratamentos, não conseguiu combater a doença. “Mesmo quando vim para cá, continuei [a consumir] e foi aí que estraguei a minha vida. Estava mesmo ‘apanhado'”, explica.

A cannabis foi apenas o início. Francisco também conheceu o haxixe e admitiu ter cultivado cannabis em casa. Quando questionado sobre os efeitos da droga, diz que sentia que era superior, capaz de conquistar o mundo. “Agora vejo que era tudo uma ilusão”, conclui.

Finda a guerra colonial e combatido o vício das drogas, iniciou um outro não menos poderoso: o álcool. “Agora afundo-me de vez em quando no vinho, para esquecer o passado e alegrar o presente. Amanhã, torno a beber para esquecer o passado, que é hoje”. Com 41 anos fica reformado devido a este vício, pois “não atinava com o trabalho”. Nunca mais voltou a trabalhar, e nunca mais deixou de beber. “Sinto falta do álcool para despertar um bocado”, explica. Por causa da dependência, foi-se afastando da família. “Interessava-me já mais a droga do que a mulher e os filhos”, desabafa.

Destino traçado

O início da guerra do Ultramar deu-se em Angola, com Salazar a recusar abrir mão das colónias e a utilizar a luta como tentativa de dominar as forças locais que queriam liberdade. Os mais jovens já sabiam o que o futuro lhes reservava. “A partir dos 18 anos, naquele tempo, já estávamos condenados a ir para a tropa. E não podíamos sair de Portugal”, explica Francisco Martins.

Depois de sete meses de milícia em Lisboa, foi mobilizado para África. Chegado a um país desconhecido, Francisco depara-se com “condições precárias” e com “uma guerra subversiva”. “Lembro-me de uma vez ir a sair e rebentar um petardo mesmo em frente à casa do general. Os dois soldados que estavam de sentinela morreram e passou um estilhaço perto de mim”, conta.

Dos pontos positivos de ir combater para outro país, Francisco relembra que adorava o clima em Angola e a liberdade sexual que já lá havia. De regresso a Portugal, o ex-combatente só pensava em voltar àquela terra que o tinha acolhido. Sorte ou acaso, Francisco não voltou a Angola, por causa do 25 de Abril.