Começou por recolher fotografias de muros durante muito tempo. Dedicou-se, em especial, à “Barreira de Segurança”, aquele que separa israelitas de palestinianos. “Senti que a questão Israel-Palestina era tão triste…”, confessa. Ao Museu de Serralves, Marlene Dumas traz, até 10 de Outubro, “Contra o Muro“, uma forma da artista partilhar a sua visão do mundo, o seu desejo de mudança.

A exposição, comissariada por Ulrich Loock, inaugura hoje, mas a abertura ao público é só amanhã, sábado. Parte dos quadros estiveram, entre Março e Abril, na galeria David Zwirner, em Nova Iorque. É a primeira vez que a mostra está patente na Europa e num museu, mas apresentando um âmbito mais alargado, já que estão também expostos trabalhos que a artista realizou na última década.

Os muros de Marlene Dumas cercam pessoas. Vemos palestinianos a serem revistados por soldados, de braços no ar, encostados a um muro [“Wall Weeping (2009)], vemos a mulher que chora a morte do filho [“The Mother (2009)]. Observamos o Muro das Lamentações, o da Cisjordânia e até as próprias barreiras mentais [“Mind Blocks” (2009)]. “Não estou contra todas as pessoas israelitas, mas acho que eles cometem o grande erro de não aceitarem críticas”, considera a artista.

“Talvez eu pinte agora os mortos porque não os pude pintar na altura.”

Na verdade, “Contra o Muro” é uma análise das barreiras que o Homem ergue, até porque a artista não se limita a reflectir sobre o conflito israelo-palestiniano. Resgata também a sua herança sul-africana, partilhando, assim, “as suas reflexões sobre o mundo”. “Talvez eu pinte agora os mortos porque não os pude pintar na altura.”

As fotografias são o ponto de partida para o trabalho de Dumas. Aliás, todas as pinturas dos muros têm essa base, já que a artista nunca chegou a deslocar-se até lá. Sobre o significado político da sua obra, a artista salienta que não teve, desde o início, esse objectivo em mente. Mas a arte, diz, pode “não mudar o mundo”, mas leva, pelo menos, a “googlar“. “Pode tocar-nos e fazer-nos repensar certas coisas.”

Para João Fernandes, director do Museu de Serralves, este é, aliás, um dos grandes propósitos desta exposição. “Esta pintura é também um empurrão grande para que estes muros possam ficar nas imagens e não separando os homens.”

Noutra parte da exposição, a artista apresenta-nos os quadros que fez na sequência da morte da sua mãe. “[Dumas] Estava em sofrimento, mas não o queria mostrar a toda a gente”, explica Loock. Decidiu, então, canalizá-lo para outras pessoas, para celebridades como Marilyn Monroe ou Ingrid Bergman, ambas retratadas, ambas chorosas.

Mas, para além das faces mostrarem sofrimento, as próprias telas têm lágrimas, considera o comissário. Através da mistura de óleo e água, Dumas criou pequenas gotas que, para Loock, fazem que “o próprio quadro esteja a chorar”. “Dirty painting (Pintura suja)”, brinca Dumas.