O terceiro dia do Correntes d’Escritas começou com uma evocação à memória e às palavras. Nesta sexta-feira, o mote da mesa foi, pois, “As palavras são apenas uma memória”, frase de Jaime Rocha. Mário Zambujal, presidente do Clube de Jornalistas, foi um dos nomes em destaque desta sessão, que contou novamente com a presença de Rui Zink, moderador da bem-disposta terceira sessão do evento.

Zambujal trouxe ao Auditório Municipal da Póvoa de Varzim as suas memórias. “[A palavra] memória traz-nos sempre à memória a passagem do tempo e temos sempre tempo para falar do tempo”, justificou.

“As palavras são memórias e as memórias vêm muitas vezes dos jornais”, continuou, relembrando uma notícia que lhe “ficou na memória” ao ler no jornal: “Uma senhora deu à luz um robusto pimpolho. Os nossos parabéns ao regimento.”

“O passado vai ter que ter cada vez mais futuro”, considera Zambujal. “A palavra ‘novo’ é uma palavra extraordinária. O novo dá-nos ideia de ruptura com as próprias memórias”, refere o autor do livro “Crónicas de Bons Malandros”.

Na mesa moderada pelo autor João Gobern marcaram também presença escritores espanhóis como Ignacio Martínez de Pisón e César Ibáñez Paris, ambos de Saragoça.

“As nossas memórias cruzam-se com aquilo que lemos”

“Viver é uma maneira de criar recordações”, evidencia Ignacio Píson. Para o autor de “Estradas Secundárias” (1997), os romancistas têm de “desfrutar ao máximo” das suas memórias.
Um outro nome de destaque foi Nuno Júdice. O docente da Universidade Nova de Lisboa e autor da obra “Pedro, lembrando Inês” (2001) leu um poema chamado “A palavra e o nada” em homenagem às palavras e a Jean Paul Sartre, um escritor que o marcou.

“Temos as nossas memórias e elas muitas vezes cruzam-se com aquilo que lemos e isso é a literatura”, disse Júdice.

“No “p” do meu Egipto ninguém mexe”

João Paulo Borges Coelho, vencedor do Prémio Leya 2009, não deixou de fazer menção ao Acordo Ortográfico: “Quem manda afinal nas palavras? No “p” do meu Egipto ninguém mexe”, rematou. “Pergunto-me se o Acordo Ortográfico não anula o passado das palavras, mordendo-as”, acrescentou o autor de “O Olho de Herzog”, que arrecadou o Prémio Leya 2009.

A encerrar a mesa, voltou a destacar-se Rui Zink que começou por dizer que “o trabalho do escritor é compreender as histórias e levar a sério as palavras”.

“Para mim a palavra ‘palavra’ e a palavra ‘memória’ são muito importantes. Tento ser um homem de palavra e um homem de memória”, disse o escritor. “É isso que me faz mexer.”