Os cartoons podem ser vistos como um discurso jornalístico, ainda que se distanciem deste por possuírem um cariz humorístico que, pela presença de opinião crítica, podem suscitar diversas interpretações por parte do leitor. O humor é uma área que chega facilmente ao público e pode, muitas vezes, possuir um forte carácter de intervenção.

Luís Afonso nasceu em Aljustrel e vive actualmente em Serpa. É um dos mais conceituados cartoonistas portugueses e assume que o que pretende com o seu trabalho é “pôr o leitor a pensar”.

Licenciado em Geografia, colabora com o jornais “Público”, “A Bola” e “Jornal de Negócios” e com a revista “Sábado”. Faz do cartoon a sua vida e vê o humor gráfico como uma forma de crítica social que, apesar de se afastar do jornalismo em vários pontos, também caminha, por vezes, no mesmo sentido.

“O meu caminho para fazer um cartoon é o mesmo que o de um jornlaista para escrever uma notícia: procuro os factos, confronto as várias versões, tento perceber as fontes”, explica Luís Afonso, assumindo como ponto de afastamento a liberdade de crítica e de opinião.

Tudo o que se passa no país e no Mundo pode ser inspiração de Luís Afonso, cuja imaginação é tanto maior quanto mais atribulada for a actualidade. “Toda esta actualidade política e económica é muito fértil em acontecimentos”, frisa o artista, que confessa que acaba por sentir dificuldade em seleccionar a informação num momento em que a actualidade é “cada vez mais rica”. “Teria que fazer três ou quatro cartoons por dia” para concretizar todas as ideias que surgem, brinca.

“Tudo o que é poder é aquilo em que eu me inspiro mais”

Apesar da sua profissão ser satirizar figuras e acontecimentos públicos, conjugar humor e política pode não ser uma tarefa fácil, pelo que o cartoonista impõe, muitas vezes, algumas reservas a si mesmo.

“Sensacionalismo puro e duro é uma coisa que não interessa”, esclarece Luís Afonso, que se refere à vida pessoal dos políticos como algo que não tem valor para ser alvo dos seus desenhos.

“Quando percebo que há algum tipo de antipatia pessoal num cartoon, faço um compasso de espera e penso que não posso ir por aí”, diz o cartoonista que, em situações dessas, opta por “reconstruir o cartoon de uma forma distanciada”.

Apesar de considerar que a censura não exista na sua arte, Luís Afonso admite ser, por vezes, necessário reflectir antes de pôr mãos à obra. Isto porque, “enquanto seres humanos, as ideias parvas surgem e são muito fáceis de fazer”.

O essencial é, segundo o artista, ter “um travão interior”, que não se trata de censura. É algo que, frisa, nunca lhe aconteceu na sua profissão, que sempre fez de “forma totalmente livre”. Importante é, acima de tudo, “que o que se vê nos espelho não envergonhe” e que o trabalho possa fazer leitores rir e pensar sobre acontecimentos da actualidade, sem implicar explorar vertentes pessoais.