Em tempos de crise, os cidadãos temem pelo seu país, demonstram desagrado pelas medidas correntes e exigem mudanças mais radicais. Por isso, quando o coração aperta, vota-se em partidos nos quais antes, talvez, não se votava. Este é um facto registado em vários países. A Finlândia é o mais recente exemplo de um país que viu o apoio à extrema-direita crescer, quando o partido “Verdadeiros Finlandeses” conseguiu uns históricos 33 lugares no parlamento.

António Costa Pinto, politólogo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, explica que, em tempo de crise, a mudança de escolha eleitoral é frequente e também é comum que “os partidos de extrema-esquerda e extrema-direita aumentem nos votos”. Esta é uma mudança que tem acontecido, sobretudo, nas democracias mais antigas.

No caso de jovens democracias, como Portugal e Espanha, foram poucas as vezes a que se assistiu a estes cenários, pois “os partidos populistas, conservadores não têm tido sucesso eleitoral”, refere o politólogo. Contudo, apesar de “os chamados partidos anti-sistema, de protesto puro e simples, não estarem a conseguir entrar na cena parlamentar”, a crise também tem impacto na escolha eleitoral dos portugueses, com os grandes partidos a obter menos votos. “Em certas conjunturas, aumenta o voto de protesto nos pequenos e médios partidos, considerando aqui o PCP, o BE e o CDS“, conta António Costa Pinto, “diminuindo nos partidos do Governo, sobretudo PS e PSD“, explica.

E foi isso que se verificou nas últimas eleições legislativas, em 2009. O CDS conseguiu, pela primeira vez, ultrapassar a barreira dos 10% (10,43%), subindo 3,19 pontos percentuais. Já o Bloco de Esquerda tornou-se a quarta força política em Portugal, conseguindo mais 3,46 pontos percentuais, ficando com 9,82% dos votos (sendo este o melhor resultado do BE numas eleições legislativas). Estas subidas, tendo em conta a conjuntura vivida nas legislativas de 2009, não surpreenderam António Costa Pinto, “na medida em que existe algum sentimento anti-classe política em Portugal que associa fundamentalmente a classe política aos grandes partidos do Governo, PS e PSD”. E, portanto, “algum sentimento de protesto aponta justamente para votações no BE, no PCP e mesmo no CDS”.

“Esses partidos nunca vão ganhar as eleições

Clara Ferreira é uma das eleitoras que confessa mudar a sua intenção de voto “quando necessário” e, nestas legislativas, pondera “não votar no mesmo partido”, pois não está contente com a escolha que fez “nas últimas eleições e com o que aconteceu no país”. Mas “a escolha é muito difícil”, afirma Clara Ferreira. Já para Alice Cunha, a escolha dos portugueses é evidente: “se não for PSD é PS, se não for PS é PSD”. E apesar dos pequenos ou médios partidos estarem a ganhar terreno no campo das eleições, Alice Cunha acredita que “ninguém vai votar no BE ou no CDS”. “Ninguém vota na direita porque os trabalhadores julgam que “lhes vão à carteira, mas também não apoiam a esquerda por causa do comunismo”.

Por isso, sobra PS e PSD. Alice Cunha queria ver o CDS no poder. “Eu gostava que o Paulo Portas fosse para o Governo”, revela, garantindo que “seria diferente”. E Clara Ferreira, que talvez vote num dos três partidos menores, afirma que “na oposição eles são bons, mas a deitar abaixo todos são bons”. “Depois de lá estarem é que se vê”, afirma, mas acredita que “esses partidos nunca vão ganhar as eleições”.

Para António Costa Pinto, os resultados das sondagens da última semana ainda não mostravam com precisão se a tendência de crescimento do BE e do CDS se vai manter ou não. Mas face a esses resultados, o politólogo salienta que “está a haver uma inversão desse ciclo, ou seja, pelo menos à esquerda parece haver alguma transferência de intenções de voto do BE para o PS, por exemplo”. No entanto, tendo em conta as sondagens da última semana, frisa o facto de ser surpreendente que, “nesta conjuntura eleitoral, os dois grandes partidos – apesar do esforço de polarização – não estarem, hoje, pelo menos, segundo os estudos de opinião, a concentrar mais votos”.

As sondagens divulgadas esta segunda-feira indicam uma subida do PSD (de 1,2 pontos percentuais) e uma descida do PS (de 1,8 pontos percentuais). Quanto aos pequenos e médios partidos, o CDS subiu (1,4), o BE caiu nas intenções de voto (1,3) e a CDU manteve. Assim, para que se abra a porta a um Governo de maioria absoluta, o CDS parece continuar a ser a chave mestra, registando, nas sondagens divulgadas, um comportamento eleitoral uniforme e estabilizado. E os principais partidos já não conseguem conquistar a maioria, com os eleitores a desviar o voto para os outros partidos.

Tanto sou fiel ao partido como sou fiel ao clube

Mas se uns estão descontentes e alteram a sua intenção de voto, outros mantêm-se fiéis ao partido e há quem não mude, como nunca mudou, a sua escolha eleitoral. Ramiro Moreira é um desses eleitores. “Eu sempre votei PSD e vou continuar a votar”. “Mudar porquê?”, questiona, afirmando que “a crise foi criada por este louco que está no Governo como primeiro-ministro há seis anos”. “É votar contra ele”, acredita.

“Tanto sou fiel ao partido como sou fiel ao clube” garante uma vendedora de peixe do Bolhão. E também Maria Rosa pensa em votar no mesmo partido de sempre. “Nao tenciono mudar, pois concordo com o que o meu partido está a fazer”, acreditando que “os outros não façam grandes mudanças”.