Miguel Martins era, há dez anos atrás, editor do Publico.pt. José Vítor Malheiros era o director. Lourenço Medeiros pertencia à equipa da SIC Online. Estes três jornalistas tinham em comum o facto de estarem na redacção no dia 11 de Setembro de 2001 e terem assistido, do espaço informativo privilegiado que é uma redacção, ao ataque terrorista que mudou o Mundo.

Se o embate do primeiro avião chamou a atenção para as famosas Torres Gémeas de Nova Iorque, numa tarde noticiosa aparentemente normal, o que se seguiria apanhou todos de surpresa. Lourenço Medeiros, na equipa da SIC Online, estava em casa quando viu o primeiro avião e na redacção aquando do segundo embate. “Acho que aconteceu o mesmo com todos os jornalistas”, explica.

Na redacção, as emoções eram fortes. “A nossa redacção era muito recente, por isso houve uma quase euforia, um fervilhar de emoções. É uma sensação muito especial estar numa redacção num momento destes”, explica. “Foi um grande teste”, diz, para o qual não há preparação possível.

Em termos técnicos, “mal deu para esfriar a cabeça”, pois a principal preocupação de quem trabalhava para plataformas digitais naquela tarde era: “Será que o site aguenta o aumento de tráfego?”. Isto porque esta foi, talvez, “a primeira vez em que as pessoas recorreram em tão grande número à Internet, em Portugal, para conseguir mais informação”.

José Vítor Malheiros, director do Publico.pt em 2001, acredita que houve um “salto qualitativo” no “padrão de consumo de notícias” nesta altura. “Um acontecimento desta dimensão”, que “rasga completamente toda a lógica”, cria, diz, “uma lógica de produção contínua da notícia”, fruto da necessidade de actualizações constantes para fazer face à procura de novas informações. Como tal, este foi “o acontecimento ideal para ser tratado por um meio de comunicação online”, um meio “que não tinha compromissos de programação” e “não tinha obrigações históricas”.

“O 11 de Setembro é o grande momento em que os consumidores de notícias sentem, de uma forma aguda, a necessidade de acompanhar um acontecimento em tempo real. Há uma carta de alforria que o online adquire”, entende. De súbito, “todas as possibilidades do jornalismo online tornam-se não apenas convenientes ou interessantes, mas indispensáveis”, recorda.

“Há qualquer coisa ali que sai fora do nosso sentido de Humanidade”

O impacto do evento, no entanto, demorou a ser conhecido. Miguel Martins, editor do Publico.pt, relembra a incerteza que se vivia na redacção nos primeiros momentos. “Lembro-me que chegou uma notícia das agências quando estava a sair para almoçar. Enquanto colocávamos na rede uma pequena notícia sobre o primeiro embate, olho para a TV e vejo outro avião. Houve um silêncio de uns segundos na redacção. Só pensava que isto não estava a acontecer”, recorda.

Passado o choque inicial, a redacção passou à acção. “Depois deste minutos, reagimos logo. Passado uma hora, talvez, já tinha a equipa toda a trabalhar. Como é natural, não fui almoçar. Nem tive mais fome”. A redacção inteira do online trabalhou desde o início da tarde até às 11h00 da manhã seguinte, sem pausas e sem “dar pelo tempo passar”. “Toda a minha equipa veio para o jornal trabalhar. Não lhes pedi absolutamente nada, só os vi a entrar. Outras pessoas de outras secções ofereceram-se para ajudar”, recorda. Perante a catadupa de informação que foi aparecendo, a redacção ia-se adaptando para tentar fazer face a tanto trabalho. “Fomos acompanhando conforme podíamos. Não foi o trabalho perfeito, longe disso. Foi o trabalho possível”, reconhece.

Também Miguel entende que este foi um momento decisivo para o jornalismo online e a sua verdadeira “prova de fogo”.
“Na altura, o New York Times tinha feito imensos despedimentos e havia um desinvestimento no online. Foi no balanço do 11 de setembro que o New York Times se apercebeu de que, quando acontece alguma coisa, as pessoas querem ver o que acontece e recorrem à Internet”. Porquê? Por que quem está a trabalhar, normalmente “não tem televisões, não tem rádio. Só acesso à Internet”.

Deixando de lado o impacto que o evento possa ter tido na comunicação social em termos práticos, a maior impressão ficará, no entanto, nas pessoas que viveram a história e este “acontecimento que mudou o Mundo”. “Ainda hoje me consigo chocar com as imagens. Há qualquer coisa ali que sai fora do nosso sentido de Humanidade”, revela.