O Espaço Anémona, em Cedofeita, recebe até 28 de Outubro as obras de Marta Emília, uma artista do Nordeste do Brasil que aposta no recorte e colagem para marcar a diferença.

Regados de sol, cor, movimento e perspectivas. Assim, “crescem” os painéis de recorte e colagem que, até ao final de Outubro, estão patentes no Espaço Anémona, em Cedofeita. Da autoria de Marta Emília, uma artista do Nordeste do Brasil, a exposição serve de “retrospectiva” da obra da artista, num projecto que foi “cozinhado” desde o mês de Fevereiro.

A maior parte das obras são deste ano. Produzir novos quadros a velocidade “supersónica” foi primordial para poder levar o seu espólio a bom porto, garante Marta Emília. “Foi exaustivo. É sempre muito gostoso fazer este trabalho, mas corri contra o tempo.”, admite.

Arte contemporânea em workshop

Hoje, sexta-feira, pelas 21h00, os aficionados da arte poderão usufruir de um workshop gratuito a decorrer no espaço da exposição. Em “Arte contemporânea: o que há de novo?”, os temas de ordem roçam a “arte conceptual, a poesia contemporânea, ou seja, a poesia que sai do papel, toma dimensão e espaço”, afirma.

Embora o encanto por corte, recorte e colagem venha desde criança, a artista recorda que é desde 1995 que se dedica a esta forma de arte, que marca a diferença do seu trabalho. “Tinha passado um dia na praia e, mal cheguei a casa, peguei numa superfície e comecei a brincar com uns papéis. O resultado agradou-me muito e não parei mais”, conta Marta Emília.

Brincadeiras com o papel, tesouras, cola, combinações cromáticas chamativas ao olho, a artista vai buscá-las à natureza, à luz e à música tipicamente brasileiras. “Vivo num lugar do mundo totalmente solar. Faz parte da minha essência. Está na minha pele, na minha constituição”, explica.

A inspiração que vem da pesquisa

Se assim o é, o trabalho da artista é como se fosse remendado da sua própria pele. É quase insaciável o olhar que percorre todas as formas, linhas estreitas e mais grossas, os círculos, rectângulos e triângulos. Todos perdidos em jogos de tamanhos e perspectivas. Estagnar é impensável para Marta Emília, que vai evoluindo e acrescentando elementos a este jogo. “Além das telas e do que chamo de pintura recortada, estou a enveredar pelos fios e tecidos”. A artista lembra que muitas dessas peças são elaboradas a pensar nos bordados da sua avó. Peças, essas, repletas de “cores, levando o fio, levando o traço, fazendo a relação com o bordado”.

Doutorada em Literatura Brasileira e professora e investigadora de Literatura de Língua Portuguesa e de Arte Contemporânea, Marta Emília crê que a melhor musa é a pesquisa. “O artista é um pesquisador. As obras são fruto de trabalho, pensamento, inspiração, olhar para o Mundo”, defende. “Sempre procurei aliar a poesia e a arte contemporâneas. As influências acabaram por vir de estudos, catálogos, pesquisas, museus e galerias”, enumera. Mesmo assim, não deixa de lembrar nomes como Sacilotto, Jesus Soto, Lygia Pape ou Delson Uchôa como fontes de inspiração.

A artista é entusiasta quando fala de conjugar o trabalho mais “conceptual” ao “sensorial”. Muitas das suas obras possuem nomes de músicas brasileiras. Além de cores, fios, linhas e perspectivas, tece-se música pelas mãos da nordestina. “A brincadeira com as letras de música, por exemplo, representa essa parte mais cerebral de conceito. Trabalho a ouvir música o tempo inteiro”, afirma. “O meu trabalho tem uma ‘pegada’ plástica, pop, colorida e exagerada. Encontrámos letras de músicas ligadas à Tropicália (movimento cultural brasileiro) que se encaixavam muito bem com a plasticidade dos trabalhos”. “Samambaias eléctricas” de Os Novos Baianos e “Minha carne é de Carnaval” de Tulipa Ruiz são duas das músicas que deram nome aos seus painéis.

Além da música, o rigor é o grande companheiro de horas a fio. “Pinto os papéis para poder recortar. Preciso ter o domínio da cor, da linha fina e recta. O intrigante, acho que está no trabalho minucioso. É essa a sensação que tenho quando oiço as pessoas”, relata. Para mostrar a importância do contacto directo do público com a obra artística, Marta Emília exibe, ainda, um enorme painel em que há liberdade total para retirar alguns dos seus elementos e brincar com eles.