O relatório anual sobre vigilância e censura na Internet da organização Repórteres sem Fronteiras(RsF) não deixa dúvidas: o melhor aliado contra as ditaduras é, de facto, a web e o seu papel interventivo tem crescido desde 2011, assim como as tentativas de a controlar. Numa altura em que a contestação à censura online é crescente, o relatório dos RsF dá conta de cinco mortos e 200 detidos em ações contra o controlo da Internet, 120 dos quais considerados “ciber-dissidentes”, continuam presos.

Na 4.ª edição da lista de países inimigos da Internet, que vigiam e controlam o acesso dos seus cidadãos à web, figuram 12 nomes: Arábia Saudita, Birmânia, Coreia do Norte, Cuba, Irão, Uzbequistão, Síria, Turquemenistão, Vietname e o Bahrein e a Bielorrússia, acrescentados este ano devido ao “agravamento da situação”. Mas muitos mais estão “sob observação”, entre os quais alguns países considerados dos mais democráticos do mundo, como a Austrália, o Egito, a Coreia do Sul ou França.

Os EUA e alguns países europeus também não passam despercebidos, principalmente devido às medidas tomadas para a cibersegurança e a proteção dos direitos de autor – contempladas nos documentos SOPA, PIPA e ACTA – consideradas pela organização como “desproporcionadas”. “A livre circulação de notícias e informação online muitas vezes perde para a segurança interna, para a guerra ao terrorismo e ao cibercrime e, até, para a proteção de propriedade intelectual”, afirmam.

China e Síria são “líderes da censura”

Matthias Spielkamp, da Repórteres sem Fronteiras, não é apologista de um “ranking de censura” devido à diferença de circunstâncias mas, se tivesse de enumerar os líderes da censura online do momento, optaria pela China e pela Síria.

“Os chineses conseguem impedir o acesso a sites e a alguns resultados, quando se procura por determinados termos”, explica Spielkamp. Quando ocorrem protestos no país, por exemplo, tornam a Internet tão lenta que é impossível a partilha de fotografias ou vídeos. Para além disso, a tecnologia de censura de conteúdos online é, maioritariamente, de origem chinesa.

Já na Síria, “hackers” ao serviço do governo tentam, frequentemente, obter senhas de redes sociais e blogues. Chegam mesmo a escrever notícias favoráveis ao governo com estas “identidades roubadas”. Esta situação atingiu maiores proporções aquando das revoluções da Primavera Árabe, em que a Internet teve um papel crucial na divulgação do que se passava.

“Alguns países democráticos estão longe de não ter culpas”

Mas nem só nos países indiciados são violados direitos relativos aos conteúdos online e ao uso da Internet. Em Londres, nos motins de agosto do ano passado, a canadiana Research In Motion, fabricante dos BlackBerry cujo messenger foi usado para convocar os tumultos, entregou dados pessoais dos utilizadores envolvidos à polícia. Já na Alemanha, a empresa Siemens exportou para o Irão um sistema de vigilância de SMS. Em França, é criticada a Lei Hadopi, que criminaliza a pirataria e encaminha para tribunal os dados de quem partilha ficheiros ilegais. A RsF avisa, ainda, que vai manter o ACTA sob observação.

Apesar de tudo, ainda existem exemplos positivos. A Líbia e a Venezuela foram, recentemente, eliminadas dos países sob vigilância, já que o primeiro país saiu do regime repressivo de Khadafi e está, neste momento, sem vigilância e o segundo está a tornar cada vez mais livre o acesso à Internet, apesar da relação tensa com os media.